01
Mia Miller
Desci do ônibus com a pequena mala nas mãos. Não avisei a ninguém que viria, pois queria fazer uma surpresa para o meu noivo.
Há dois meses eu não via o céu desta cidade. Eu sentia tanta falta do ar puro do Colorado.
Segurei as chaves do apartamento de Collin e sorri. Ele não sabia que eu viria, e nesse horário provavelmente ele estava trabalhando. Decidi esperá-lo aqui, já que passei duas longas semanas longe fora da cidade tentando arrumar um emprego. Tive algumas entrevistas por lá, mas como podem ver, não fui contratada.
Fui dispensada na última vez, pois não tinha experiência "exigida."
Mas como eu vou ter experiência se eles não me contratam?
Era nítido. No auge dos meus vinte e dois anos eu me senti uma perdedora.
Girei a chave na fechadura e abri a porta. Ao entrar na sala, me deparei com tudo bagunçado, típico dele.
Nos últimos nove meses, estávamos preparando o nosso casamento.
Apesar de ainda estar desempregada, meu quase esposo disse que isso não era um problema para ele.
Eu o amava.
Havia cursado administração de empresas, mas eu não imaginava que após sair da faculdade que meu pai pagou com tanto esforço, eu não iria encontrar empregos.
Joguei a mala no sofá e fui até a geladeira pegar água. Estava exausta, mas hoje eu queria fazer algo especial. Collin era paciente e nunca reclamava de nada.
Enquanto andava em direção à cozinha, bati meu dedo mindinho no sofá, causando uma dor insuportável.
"Ai" gritei pulando de um lado para o outro tentando não dar um grito"
Droga Mia.
Ao me abaixar para ver se me machuquei, notei algo estranho: sob a cadeira, uma bolsa feminina. Não era minha, mas era estranhamente familiar.
Resolvi levantar para olhar e o chaveiro de um carro caiu da bolsa, espera…
"Eu conheço a porra desse chaveiro" suspirei encarando o chaveiro com a letra "F" em minhas mãos".
Meu coração começou a acelerar e as minhas mãos tremiam ao colocar o copo d'água no balcão.
Um nó crescia em meu estômago, sufocando minha mente, e vários pensamentos horríveis pairavam sobre mim. Eu já sabia o que provavelmente aconteceria ali, mas ainda assim eu tentava procurar soluções para aquele mal-entendido.
Andei devagar em direção ao quarto, engolindo em seco e segurando o choro.
Minhas mãos tocaram a maldita maçaneta, eu não conseguia nem abrir a mesma do tanto que elas tremiam.
Finalmente tomei coragem, e a porta se abriu.
E lá estavam ele… e ela. Nus.
Meu mundo desabou num segundo. Era como se o chão sumisse sob meus pés.
Ele, o noivo em quem confiei e dividi os últimos dois anos da minha vida, com Fallon, minha melhor amiga e a pessoa que eu achava ser a minha alma gêmea e que, por acaso, estava também organizando o meu maldito casamento.
Tudo pareceu desacelerar naquele momento, e eu saí correndo sem olhar para trás.
Senti as mãos dele tocando meu braço e me afastei rapidamente.
"Mia, eu posso explicar", ele disse segurando meu braço."
"NUNCA MAIS TOQUE EM MIM! " Gritei." Quero que vocês morram!", gritei com todo ódio dentro de meu coração e puxei o ar bem fundo"
"Mia, não é isso, eu posso… não era para você estar aqui, eu…"
"Ah" levei as mãos ao rosto dando uma risada desacreditada, "Não era para eu estar aqui? A culpa foi minha por vir mais cedo? Oh, me desculpe querido." disse irônica."
"Ela não significa nada para mim, foi apenas uma vez. Eu sou homem, eu... Sabe que não conseguiria ficar sem muito mais tempo.”
Olhei para ele e balancei a cabeça em negação.
"Você é um merda, isso sim!", arremessei a jarra de vidro no qual peguei água nele"
A jarra bateu na parede me deixando com mais raiva e frustrada.
"Amor. Acredita em mim, se você… "ele gagueja. Eu te amo Mia, foi um momento de fraqueza, ela me provocou. Nós vamos casar, lembra? O que você irá dizer para todos?"
Meu pulso acelera. Continuo o observando tentando buscar um único para eu amar aquele homem.
"Quero que você e todos vão para o inferno", desferi as palavras."
Ouvi passos e vi Fallon saindo do quarto, coberta com uma camisa dele. Que patético!
Eu me sentia um lixo. Mas tive certeza que eles eram piores.
"Mia…" Fallon sussurrou," Eu não sei o que dizer"
Quando a vi, fui para cima dela num ímpeto, puxei seu cabelo imediatamente, foi a única reação possível. Eu queria acabar com ela.
Collin me segurou
"Então era por isso que me dava tantos conselhos dizendo que esse inútil não servia para mim? Porque ele servia para você, na verdade. Vocês se merecem!"
Peguei minha mala e saí em direção à porta, meu rosto ardia de tão vermelho, e as lágrimas não paravam de cair. Eu não acreditava que eles fossem fazer isso comigo.
Desci o prédio com o coração doendo e as lágrimas descendo sem controle. Era como se tudo estivesse doendo no meu corpo, chegava a ser uma dor física.
A traição doía, mas ter confiado nele doía ainda mais.
Peguei um Uber e permiti que as lágrimas caíssem durante toda a viagem. A cada segundo eu imaginava como eu iria desconvidar as pessoas dizendo "olha, não vai mais haver casamento, fui traída".
Lembro-me de como imaginei, como sonhei com esse momento do casamento… Ele era o meu primeiro namorado. E Fallon, fingindo ser minha amiga esse tempo todo.
Ela esteve comigo quando minha mãe morreu, e em todos os momentos. Achei que a nossa amizade seria eterna.
Era melhor ter um inimigo declarado do que um amigo
"Pai?" gritei ao jogar a mala no sofá.
Silêncio.
Ótimo, ele não estava em casa. Poderia chorar à vontade.
Peguei o celular que estava no modo silencioso. Dez ligações e vinte mensagens de Collin. Babaca. Ignorei todas as suas tentativas de contato, apaguei seu número e o bloqueei.
Ao me sentar na cadeira, avistei uma carta no balcão.
A palavra "hipoteca" saltou à vista, e uma respiração assustada escapou de mim. Um frio percorreu minha espinha.
A simples menção daquela palavra trouxe uma preocupação imensa.
Abri a carta que detalhava como meu pai havia hipotecado nossa casa e como estávamos à beira de perdê-la. Cem mil dólares: a quantia que devíamos para salvar nosso lar. Por que ele faria isso e não me contaria?
Uma onda de desespero e impotência me atingiu. O que fazer? De onde tirar essa quantia? E como? Questões rodopiavam na minha mente, mas nenhuma resposta parecia clara.
Tentei me mover, ter alguma reação, mas parecia estar imóvel. Com o celular em mãos, tentei falar com meu pai para pedir uma explicação, mas só consegui a caixa postal.
"Merda!", esbravejei.
Liguei então para minha ex colega de faculdade Charlotte. Precisava encontrá-la antes que eu perdesse o controle. Não éramos tão próximas quanto eu era com a vadia da Fallon, mas sempre nos víamos casualmente, e ela era uma boa amiga.
"Preciso muito te ver", falei entre soluços. "Naquele pequeno bar em que íamos depois da faculdade"
Vesti um vestido qualquer e peguei minha bolsa após passar quase todo o corretivo na tentativa de esconder meu rosto choroso.
Olhei novamente a carta da hipoteca, e tentei entender porque meu pai faria isso.
A casa era a única coisa que nós tínhamos. Após minha mãe morrer, ficamos sem rumo. E meu pai se embebedava todas as noites.
Apesar disso, ele era um homem bom. Nunca me deixou faltar nada, e arcou com tudo que eu precisava para ser alguém.
Esse dia de merda não poderia piorar.
Traída pelo namorado, descobri que estamos praticamente sem ter onde morar. E o pior: não faço ideia de como resolver isso.
Quero apenas afogar minhas mágoas em um copo de whisky.
Nada mais importa agora. A traição, a perda iminente da casa… Nada. Sinto-me à deriva, desligada de tudo, exceto da dor que parece consumir todo meu ser.
Lá, ninguém vai se importar com minha história triste e eu seria só mais uma garota no bar.
E talvez seja isso que precisasse, um instante onde nada importaria.