Agora você é nossa
SARAH
O motorista da noite passada insiste em me levar pra casa. Diz que seria morto se descobrissem que me deixou pegar um táxi. Eu não quero andar no carro deles. Não posso correr o risco de que descubram onde moro.
Então aceito a oferta, mas só deixo ele me levar até a frente do clube da noite anterior. Agradeço e procuro meu carro no estacionamento. Quando sento no banco do motorista, me dou conta de que estou voltando pra um lugar que já foi meu lar. Percebo que os fundamentos do meu casamento mudaram, e que o final feliz que imaginei pra mim e pra meu marido... nunca passou de ilusão. Balanço a cabeça pra afastar a dor no estômago enquanto giro a chave e dou partida no motor.
Assim que chego em casa, mal consigo fechar a porta antes da voz do Aaron ecoar pela casa. Ele está aos pés da escada, usando uma calça cargo azul e uma regata branca. É. Ele não está vestido pra trabalhar, porque ele não trabalha. Tudo o que fez foi me ajudar a fundar minha seguradora, a Wellspring, anos atrás. Desde então, só colhe os frutos.
— Onde diabos você estava?
Não respondo de imediato. Tiro os sapatos, o casaco, e finjo que ele não está ali. Sinto o olhar dele queimar minha pele ao me ver com o vestido vermelho curto. Sempre deixo um casaco no carro, por precaução.
— Eu te fiz uma pergunta, Sarah. Vai me dizer de onde tá vindo vestida igual uma vadia de quinta?
Respiro fundo e levanto o olhar pra ele. Quando finalmente falo, minha voz sai estável.
— Não é da sua conta o que eu faço, Aaron. Nosso casamento é aberto, lembra? O que eu faço, com quem e onde, não é problema seu.
Ele ri.
— Que bonitinho — diz, balançando a cabeça. — Espera aí, Sarah. Você acha que pode me deixar com ciúmes? Você? Ah, vai... você é patética demais pra isso. E vamos ser honestos, se um dia você tentar transar com outro cara, ele vai te dizer a mesma coisa. Aposto que, onde quer que você tenha ido vestida assim, te trataram como a vagabunda barata que você é.
Será que trataram?
Não sei por quê, mas as palavras dele doem mais do que deveriam.
Repito pra mim mesma que não me importo — que já esperava isso vindo dele. Que os irmãos HawkThorne provaram que eu ainda sou desejável. Que a opinião do Aaron não importa.
Mas meu corpo me trai. A garganta aperta. O peito se afunda. Viro nos calcanhares e subo as escadas direto pro nosso quarto. Entro no banheiro e tranco a porta antes de deixar as lágrimas caírem.
Sento na tampa do vaso fechado, pressionando as palmas das mãos contra os olhos, tentando afastar a dor.
Era isso que ele queria, né? Liberdade. Relacionamento aberto. Então por que parece que só eu estou desmoronando? Por que ele pode estar feliz enquanto eu me sinto miserável? Fico no banheiro por horas, chorando como se não houvesse amanhã. Já estou atrasada pro trabalho, mas... quem se importa?
Minha assistente pessoal pode... merda. Eu demiti ela. Mandei mensagem pro RH a caminho do clube, avisando da demissão, e fiz questão de explicar o motivo, mesmo sabendo como isso me faria parecer. Vai saber? Se ela não fosse uma mulher de meia-idade, Aaron provavelmente teria tentado comer ela também.
Limpo os olhos e me levanto. Preciso ir trabalhar. A Wellspring é tudo que me resta.
Quando finalmente me recomponho e saio do quarto, ouço um som. Um gemido abafado, seguido do ranger de móveis. Meu coração dispara enquanto sigo o som. Meu corpo já sabe o que vou encontrar, mas minhas pernas continuam andando.
O barulho vem do meu escritório.
A porta está entreaberta. Empurro só o suficiente pra ver—
Aaron. Com outra mulher. Não é minha ex-assistente. É outra. O desgraçado tem uma lista inteira. E está transando com ela ali mesmo, na minha mesa.
Ela grita de prazer enquanto derruba um porta-retrato meu no chão, estilhaçando o vidro. Aaron não para. Nem reage ao que ela fez.
Meu estômago despenca.
Eu não choro. Não grito. Nem respiro. Só me viro, volto pro quarto e me visto pro trabalho.
Fico horas sentada no carro, encarando a rua vazia, as mãos fechadas no colo. O celular toca, me tirando do transe.
Kevin. Meu irmão querido. A única pessoa com quem eu precisava falar.
Limpo a garganta e atendo.
— Oi.
— Tá tudo bem? — A voz dele parece tranquila, mas eu o conheço. Tem algo ali.
— Tô, sim.
— Tem certeza? Porque meus amigos — lembra dos HawkThorne? — disseram que te encontraram ontem. Disseram que você parecia meio pra baixo, mas que deram um jeito de te animar. Tem alguma coisa que você quer me contar, berry?
Um suor frio escorre pelas minhas costas. Aperto mais o telefone.
Animar? E sim, meu irmão me chama de berry. Quando pequena, eu vivia comendo frutas vermelhas. Era meu consolo. Mas voltando ao pânico...
— Eles... eles te disseram isso? — minha voz falha enquanto meu coração martela no peito. Certamente, não contaram mais nada... né?
Kevin murmura.
— Aham. Por quê?
Solto o ar devagar, tentando manter a calma.
— Nada, não. Valeu por ligar, Kev. Preciso ir.
Desligo antes que ele possa perguntar mais. Meu pulso está acelerado agora, um outro tipo de pânico se instalando.
Puxo o cartão deles da bolsa, encaro o número, digito no celular e, antes que possa pensar duas vezes, aperto o botão de ligar.
Toca uma vez. Duas.
Então uma voz grave atende.
— Até que foi rápido. — É o Ronan.
Cerro os dentes.
— O que, diabos, vocês disseram pro meu irmão?
Malachi dá uma risadinha do outro lado da linha.
Eles tão sempre juntos, é?
— Relaxa, querida. A gente só tava cuidando de você. Agora que você é nossa.
Dou um riso de escárnio.
— Eu não sou de vocês. O que aconteceu foi um erro. Não pode acontecer de novo.
Silêncio. Então a voz do Ronan volta, mais sombria, mais baixa.
— Que fofo, Sarah. Mas você não tem escolha.
Meu estômago se contrai.
— Já te provamos uma vez — continua ele —. E vamos provar de novo. E de novo.
Sinto o calor escorrer entre minhas pernas.
Para com isso, Sarah. Você não devia estar sentindo isso.
Eu sei. Mas não consigo parar.
A voz do Jaxon entra em cena, sedutora, como se já soubesse.
— Aposto que já tá toda molhadinha, só de ouvir a gente.
Odeio que ele esteja certo.
Desligo antes que possa me trair ainda mais.
