Capítulo 1
Eu olhei para a porta, que permanecia igual àquela que eu lembrava. Este é o lugar que estava nos meus sonhos dia e noite, foi a crença que me sustentou durante inúmeras noites sem dormir na prisão. Como eu queria abrir esta porta novamente e ir até minha família, assistir televisão juntos, jantar e conversar com eles. Minha mãe me abraçaria, meu irmão me traria os meus petiscos favoritos, até mesmo o meu pai, que é o mais sério, se preocuparia silenciosamente comigo.
As lembranças afetuosas do passado vieram como uma onda, mesmo que o mundo do outro lado da porta tenha se transformado em um inferno, ainda assim, levantei a mão e toquei a campainha.
A porta se abriu, e o que eu vi foi o rosto familiar da minha mãe, sem a amabilidade de antes, apenas pavor e uma repulsa quase imperceptível.
— Mãe, estou de volta. — Eu quebrei o silêncio.
Ela rapidamente forçou um sorriso, dizendo palavras carinhosas, mas com uma expressão superficial de preocupação.
— Ah, você voltou! Perdeu bastante peso, se esforçou muito. — Ela disse enquanto estava parada na porta, como se não quisesse que eu entrasse.
Eu me espremi e entrei de lado, e ela rapidamente fez um sinal para meu irmão e minha cunhada.
— Rápido, a Isa voltou! — gritando para toda a sala.
Minha cunhada imediatamente, colocou uma máscara, segurou um frasco de álcool e começou a borrifar em mim, com um grande arranjo de plantas vindo em minha direção.
Seus movimentos eram tão rápidos que não tive tempo para reagir, apenas senti as folhas arranhando minha pele e o álcool ardente no nariz.
Depois disso tudo, ela se virou e jogou o que tinha nas mãos na lixeira.
— Isso é para te afastar da má sorte. Você não quer que as coisas sujas de lá de fora venham para dentro de casa e afetem seu sobrinho, certo? — disse ela, arrastando os lábios em um sorriso.
Foi então que eu reparei a barriga dela, já visivelmente grávida, ou seja, enquanto eu estava na prisão pagando por um crime que ela cometeu, suportando a culpa de um assassinato, ela desfrutava do conforto e da vida em família.
Eu olhei para ela, não disse nada, apenas fui em direção ao quarto que antes pertencia a mim, mas o que eu vi foi um depósito. Minhas coisas não estavam mais lá.
— O que está acontecendo? — perguntei, olhando para os três atrás de mim.
Minha cunhada, calma, estava fazendo as unhas, meu irmão franziu a testa.
— Bom, você ficou tanto tempo fora, e a casa é pequena, então nós apenas colocamos essas coisas no seu quarto temporariamente — disse minha mãe, envergonhada.
— E as minhas coisas? — perguntei.
— Ah, estavam ocupando espaço. Além disso, não sabíamos se você ainda iria usá-las. Algumas foram vendidas, outras jogadas fora. — Minha mãe respondeu.
Minhas lágrimas começaram a escorrer descontroladamente.
— Vocês sabem por que eu fui para na prisão, e mesmo assim eu apenas cumpri uma pena, não morri! — Minha voz tremia de emoção ao falar.
Diante o meu questionamento e da minha raiva, meu pai, que estava em silêncio até então, adotou a postura de chefe da família.
— Sua cunhada está grávida de cinco meses, apenas estamos fazendo do seu quarto um quarto de bebê. Por que todo esse alvoroço? As suas coisas não serviam para nada, que se dane. — Ele disse.
Ao ouvir essas palavras, o último resquício de esperança que eu tinha em relação a esta família desapareceu completamente.
Olhando para a expressão indiferente do meu pai, me lembrei de quando ele me disse com seriedade, que iria guardar todos os meus presentes de aniversário de todos os anos, para mostrá-los a todos no meu casamento, como a sua pequena princesa havia crescido.
Mas agora, tudo isso e todos os meus pertences se transformaram em coisas inúteis, não é?
Eu achava que, após ver os rostos do meu irmão, da minha cunhada e da minha mãe, meu coração não doeria mais. Mas eu me esqueci de que familiares são as únicas pessoas capazes de nos fazer sentir ainda mais desesperado depois do maior desespero, e seu coração se despedaçar mais ainda depois de despedaçado.
— Então, onde eu vou morar? — Respirei fundo e perguntei.
Minha mãe trocou olhares com meu irmão e cunhada, pegou duzentos reais e jogou em cima da mesa de centro.
— Aqui, pegue esse dinheiro e vá encontrar um hotel ou alugue um lugar, tanto faz. — O tom de voz dela era congelante.
Eu não olhei para o dinheiro em cima da mesa, meus olhos passavam pelo rosto dos quatro.
— Irmão... — Eu olhei para ele. — Você também pensa assim? Você sabe que eu estive presa por causa de você...
Minha frase foi interrompida pelo meu irmão.
— Isa, não precisa ficar relembrando o passado, mas se você insistir em ficar aqui, eu não farei nada, não posso simplesmente colocar minha irmã para fora. — A resposta do meu irmão fez meus olhos se encherem de lágrimas.
— Sim! Obrigada, irmão, vou ficar aqui por um tempo. — Eu sorri e puxei o braço dele como antes.
Mas quando tentei segurar sua mão, ela passou direto. Quando olhei confusa para ele, encontrei os olhos venenosos da minha cunhada. E a expressão do meu irmão era como se ele tivesse comido algo estragado.
— Isabela, você perdeu os neurônios na prisão? Você já é adulta, como pode não ter vergonha de ficar na casa dos outros depois de tão velha e sair da prisão? — disse minha cunhada, com as mãos na cintura e apontando para mim.
— Cunhada, e eu fiz isso por quem? E como assim casa dos outros? Quem pagou o sinal e as prestações da casa? — Eu ri de raiva, apontando para o meu rosto e perguntando.
Olhei para o meu irmão, que já não estava com disposição para conversar, e então me voltei para meu pai, que estava fumando no sofá.
— Pai... — disse.
— Esta casa agora é da sua cunhada, ela manda aqui. — Meu pai deu mais uma tragada no cigarro.
Eu olhei novamente para a minha cunhada, meu irmão ainda estava franzindo a testa, com um ar angustiado e arrependido.
— Ouviu? Esta casa agora é minha, e eu não quero que gente como você more aqui. Não adianta ficar olhando para o seu irmão, o que eu estou dizendo é exatamente o que ele pensa. Saia da minha casa agora ou vou chamar a polícia. — Minha cunhada interveio novamente.
O ambiente ficou repleto de um silêncio constrangedor, enquanto eu olhava para a família pelo qual eu havia proporcionado dinheiro, liberdade e até mesmo o futuro da minha vida, meu coração estava num estado além da raiva, tinha se transformado em desolação.
— Eu já não fiz o suficiente por esta família? Como vocês mudaram tanto? O que eu fiz de errado? — Eu dei um sorriso triste e falei com dificuldade.
— O seu erro é que você agora não tem utilidade! Você costumava ganhar dinheiro e ajudar nas despesas. Agora, você é uma assassina, o que pode nos trazer de bom? Não só não pode ganhar dinheiro, como nem mesmo consegue receber um dote ao se casar, só pode ficar em casa sugando as conquistas da família. — Ela continuou. — É, eu sei que você sacrificou algumas coisas pela família, mas pense bem, o que você estará fazendo aqui além de nos arrastar para o fundo do poço? Se você realmente se importa com a família, deveria sair logo daqui.
Ela apontou com o queixo para os duzentos reais jogados na mesa de centro.
— Isa, sua cunhada está certa, quanto mais gente, mais bocas para alimentar. — Minha mãe também entrou na conversa. — Além disso, a sua cunhada está grávida. Na verdade, você como tia deveria ajudar a cuidar do sobrinho. Dada a sua situação, não estamos te pedindo nada demais, apenas leve esse dinheiro e arranje alguma forma de se sustentar.
— Mãe, eu também sou sua filha, não sou? — Depois de liberar minha raiva, fiquei mais calma.
— Isa, você sabe que é minha filha. Mas agora, com essa situação, nem mesmo um dote você consegue dar à família. Eu cuidei de você todos esses anos, e foi tudo em vão. Vá logo, não me dê mais problemas.
— Eu dando problemas? Todo mês eu entrego todo o meu salário, ajudei com a entrada da casa e até com o financiamento, e na hora de receber meu dinheiro, ninguém fala que sou um problema!
— Isa, eu sei que você está irritada. — Depois de um longo silêncio, meu irmão disse. — Mas não foi nada fácil durante os anos que você esteve presa. Passamos a ter uma assassina na família, e onde quer que formos, as pessoas apontavam o dedo. Se você realmente ficar em casa, pense em como os nossos pais, nessa idade, vão lidar com isso. Meu filho vai nascer já com a fama de fazer parte de uma família assassina? Você não consegue pensar em nós?
Eu olhei para ele, com uma expressão séria, e só consegui achar engraçado.
— André, não se esqueça, a verdadeira assassina é a sua esposa. — Continuei. — E quem trouxe esse desgosto para a família foi sua esposa. Se você realmente se importasse com a família, deveria fazer sua esposa confessar, e não colocar a culpa em mim.
Três anos atrás, ela dirigiu o meu carro na estrada e, após uma discussão, empurrou alguém em direção a um caminhão, causando a sua morte instantânea.
Eles imploraram para que eu deixasse um legado para a família Belmonte.
Diziam que meu irmão não estava bem de saúde e no trabalho, que seria difícil encontrar alguém disposta a casar com ele. Se minha cunhada fosse presa, ele perderia a oportunidade de ser pai.
Meu irmão é o único filho da nossa família e sempre foi muito bom comigo. Com as lágrimas da minha mãe e os suplícos da minha cunhada, acabei cedendo e trocando isso por três anos de vida na prisão.
Na época, eles seguravam minhas mãos, chorando e dizendo que eu era a grande heroína da nossa família.
Agora, eles me olham com desprezo, como se eu fosse algo sujo a ser evitado.
Eu assumi toda a responsabilidade, gastei todas as minhas economias em indenizações e desculpas, suportei ameaças e insultos, e ainda passei três anos presa.
Eu achava que valeria a pena, mas agora vejo que me enganei sobre meus parentes de sangue.
Levantei o queixo e tentei segurar as lágrimas, olhando-os com raiva.
Meu pai parecia não gostar do meu olhar.
— Isabela, não criamos você para ser ingrata! — Exclamou ele, batendo na mesa e se levantando. — O que sua família está tentando lhe dizer é claro! Você passou três anos na prisão mas nós ainda precisamos viver. Você vai continuar manchando o nosso nome?
— Isa, você sempre foi uma criança sensata. Como pode ter se tornado tão confusa depois de alguns anos? Não é papel de uma mulher casar e ter filhos? Na verdade, seu pai e eu planejamos encontrar um bom marido para você, o dote que receberíamos seria uma forma de agradecer por tudo que fizemos por você. Mas agora, carregando o título de assassina, quem irá querer você? Nós não vamos nos importar que você não traga um dote de volta, deixá-la entrar nesta casa já é prova da nossa relação mãe e filha. — Minha mãe também apoiou.
— Isso mesmo, sobre você ter assumido a culpa pela sua cunhada, não importa se foi na época ou agora, nós já lhe agradecemos. — Meu irmão disse com firmeza.
— É, eu realmente te agradeci sinceramente antes — disse minha cunhada, acariciando a própria barriga. — Mas agora você não quer ir embora, está mesmo disposta a viver às custas da família? E se você não for, onde vai ficar o neto da nossa família quando nascer?
A forma como ela falou me fez parecer uma pessoa que não sabe a hora de ir embora, desrespeitosa, que não entende a dificuldade de criar um filho.
Meu pai se aproximou e jogou novamente os duzentos reais na mesa.
— O dinheiro já foi dado, você já entrou pela porta de casa. O que mais você quer? Se não for embora, vou agir como se nunca tivesse tido uma filha!
As palavras de cada um deles eram como facadas envenenadas atingindo meu coração.
Mas depois de ver o lado verdadeiro deles, eu já havia colocado uma armadura.
— Não é de se admirar que, durante todos esses anos, vocês nunca me escreveram uma carta ou vieram me visitar. Parece que já achavam que eu não valia nada, que não traria dinheiro de volta, e me jogaram para fora — eu disse friamente.
Olhei para os rostos deles, alguns impacientes, outros irritados e outros indiferentes.
— Eu pergunto uma última vez, esta casa não me aceita? — Eu disse palavra por palavra.
— Sim! — Foi meu pai quem respondeu desta vez.
Os outros três tinham expressões frias e decididas, como se eu fosse uma inimiga.
— Certo, certo. Como quiserem, eu irei embora. A partir de hoje, cortamos laços. Espero que não se arrependam. — Meu tom indiferente talvez tenha irritado minha cunhada.
— Você se valoriza demais. Uma assassina que viverá na pobreza a vida toda, do que você tem a se arrepender? — Ela gritou para minha silhueta que se afastava. — Manter você, esse lixo social, em casa sugando as conquistas da família, é que é o verdadeiro arrependimento!
Ao me virar, uma lágrima escorreu pelo canto do meu olho.
Permiti que a lágrima quente deslizasse pela minha bochecha fria, essa era a última gota de carinho que eu tinha por esta família, a última lágrima.
Após essa lágrima, não havia mais conexão alguma com esta casa.