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Com o coração na garganta

Parte 5...

Elena

— Meu Deus!... - Vicky cobriu a boca com a mão, as lágrimas começando a encher seus olhos — Por que alguém faria isso... Que horror!

— Eles vieram atrás de nós - eu sussurrei, engolindo em seco, enquanto o horror da situação se tornava realidade pra mim — Eles vieram atrás de nós... - molhei o lábio com a ponta da língua — Nós vimos algo que não deveríamos ter visto... - olhei para ela.

Vicky começou a hiperventilar, o pânico tomando conta de seu rosto. Eu me virei para ela, tentando encontrar as palavras certas, mas eu mesma estava à beira de entrar em desespero.

— Eles podem voltar, Elena... - ela choramingou, segurando em meus braços com força — O que vamos fazer? Não temos para onde ir... E se eles voltarem aqui de novo?

Eu não sabia o que dizer a ela, porque também não sei de verdade. Meu coração estava batendo tão rápido que eu mal conseguia pensar.

O trailer é nosso único refúgio e tinha sido invadido. Era como se o chão tivesse sido puxado debaixo de nossos pés. É muito ruim.

A cada objeto destruído que eu via, sentia a pouca segurança que nós temos, escorrer por entre meus dedos.

— A gente precisa sair daqui - eu disse finalmente, embora minha voz não carregasse a firmeza que eu queria — Não podemos ficar. Se eles voltarem...

— Mas... Para onde vamos? - Vicky me perguntou, a voz tremendo — Não temos ninguém, Elena... Nós somos sozinhas...

O peso dessa verdade nas palavras dela me atingiu com força. O mundo parecia que não se importava com a gente e as paredes do trailer se tornavam uma prisão sufocante.

Eu queria chorar, queria gritar, mas sabia que não podíamos nos dar ao luxo de perder a cabeça. A gente precisava de um plano e rápido.

— Pegue o que puder carregar - eu a instruí, tentando manter a calma — Pegue roupas, dinheiro... Qualquer coisa que possamos usar. Vamos dar o fora daqui antes que eles voltem.

Vicky assentiu, seus olhos ainda cheios de medo, mas ela sabia que eu estava certa.

Começamos a pegar o que restava, enfiando as roupas em sacolas e nas mochilas, vasculhando entre os destroços por algo que fosse útil pra gente.

Meus dedos tremiam enquanto eu abria as gavetas reviradas, procurando nosso pouco dinheiro, as economias que tínhamos juntado com tanto esforço. Foi uma sorte que a gente escondia o dinheiro no fundo falso de uma gaveta embaixo da pia.

Enquanto eu enchia a sacola, um pensamento me ocorreu. Só pode ter sido aqueles homens. Ou será que isso foi só uma coincidência terrível?

— Eles... Eles vão nos encontrar, não vão? - Vicky perguntou, quebrando o silêncio tenso — E se... E se eles estiverem nos vigiando agora mesmo?

Eu engoli em seco, tentando afastar o medo que ameaçava me dominar. Eu não sou essa pessoa corajosa que Vicky pensa que sou.

— Não pense nisso agora. A gente só precisa sair daqui.

Arrumamos tudo o que podíamos em silêncio, cada pequeno ruído que vinha lá de fora fazendo meu coração saltar dentro do peito.

Eu mal conseguia pensar direito. Desde que soube que íamos sair do orfanato eu já tinha certeza de que dias complicados e difíceis iam acontecer, mas nunca pensei em algo assim.

As coisas que vinham ao meu pensamento, sobre os minutos e as horas que viriam, me deixavam ansiosa e nervosa.

Quando finalmente terminamos, olhei em volta mais uma última vez, sentindo uma pontada forte de tristeza. Nosso único canto que pra gente era nosso lar, estava destruído.

— Vamos - eu disse empurrando a porta e olhando para fora — Vem, vamos sair daqui.

Saímos quase correndo, com o coração na garganta. A noite parecia uma sombra que se estendia como uma mão ameaçadora ao nosso redor. Estamos na rua, desprotegidas.

O vento frio chicoteava nossos rostos e eu apertei as sacolas e a mochila contra meu corpo, tentando acalmar o coração acelerado. Não sei ainda para onde nós vamos, mas não dá pra ficar esperando o que vai acontecer.

** ** **

Ser órfã é algo muito ruim e difícil, mas ser órfã jogada nas ruas de uma cidade como Chicago, é mil vezes pior.

Em um momento como esse, nós não temos ninguém para nos proteger e ajudar. E nem mesmo sabemos de quem ou o que, precisamos nos proteger sozinhas.

O bairro onde moramos é afastado e por isso mesmo, tem pouco movimento, ainda mais a essa hora, o que me deixa mais preocupada.

O silêncio da noite parecia sufocante ao nosso redor enquanto andávamos pelas ruas desertas, cada passo ecoando na minha mente como um martelo.

O medo nos guiava, fazendo-nos andar mais rápido, quase correndo, como se pudéssemos escapar da sombra do perigo que nos perseguia. Não sei quem está com mais medo. Se eu ou a Vicky.

Não tínhamos um destino, apenas a urgência de fugir. Ver o trailer daquele jeito me causou mais arrepios do que o frio da chuva.

— O que vamos fazer agora, Elena? - Vicky perguntou, sua voz carregada de desespero — Será que ainda tem algum abrigo aberto a essa hora? - seus olhos grandes estavam cheios de lágrimas não derramadas, refletindo o mesmo pavor que eu sentia.

— Não sei... Acho difícil que estejam abertos ainda - admiti, minha voz soando frágil até para os meus próprios ouvidos. — Mas não podemos voltar. Precisamos encontrar um lugar seguro, longe daqui.

Mas onde? A pergunta martelava na minha cabeça enquanto continuávamos a andar sem rumo, o vento frio cortando nossos rostos como facas.

A cidade, que antes parecia apenas indiferente, agora parecia uma armadilha cheia de perigos ocultos. Cada sombra, cada ruído distante, fazia meu coração acelerar de medo.

Eu não gosto de ficar perambulando pelas ruas sem ter um rumo ou algo a fazer. Prefiro me resguardar em casa e só saímos quando temos que vender nossas flores pelos restaurantes e boates da cidade.

O centro mais agitado de Chicago não é um bom lugar para certos tipos de pessoas e em especial, pessoas como nós, que não temos onde cair mortas.

Um motoqueiro passou por nós fazendo um barulho horrível que fez Vicky tapar os ouvidos com as mãos. Meu coração acelerou porque pensei que ele iria parar, mas só nos deu uma olhada e seguiu.

Seria bom que ninguém parasse para nos incomodar, até encontrarmos um lugar. Mas não foi assim.

Ninha Cardoso

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