Capítulo 1
Antônio estava do outro lado da balança, havia roubado tantas pessoas e casas, que por onde passava, as pessoas que o conheciam já entregam suas bolsas ou suas carteiras voluntariamente.
Meu pai não sabia que eu estava andando com ele nas minhas horas vagas de estudo, e se soubesse teria me matado, não literalmente falando. O lema do meu pai era “Diga com quem tu andas e eu direi quem tu és”.
Ah! Se meu pai soubesse das minhas intenções, minha vida teria seguido um curso diferente. Até o imaginava falando grosso em minha mente, e só de pensar que iria segurar uma arma, agrava o som da sua voz como se fosse minha consciência falando.
***
Estava na sala de aula, era dia da prova de final de ano, e se eu passasse naquele ano, faltariam apenas trezentos e sessenta e cinco dias para concluir o curso. O suor escorria, o verão havia chegado com toda sua força, – praticamente um estágio para entrar no inferno – mas não era o calor que me tirava a concentração, era outra coisa. Olhei para prova ainda mais desanimado que o normal. Cálculos por sobre cálculos. E, embora gostasse muito dos números, eu queria mesmo era sair daquela sala e respirar a brisa do lado de fora e deitar embaixo de alguma árvore para pensar na vida.
Minha cabeça fervia, pois não conseguia prestar atenção na prova, só pensava no assalto e em como eu não poderia ser pego ou ainda pior, ser reconhecido, apesar da máscara.
— Tempo encerrado — o som da voz rouca do professor, que mais tirou minha paciência naquele ano, ecoou pela sala.
— Por favor, fechem suas provas e as deixem sobre a minha mesa — todos estavam nervosos. Uns olhavam torto para ele, outros sibilavam palavrões baixinho, xingando fielmente a mãe dele ou olhavam feio, eu fazia as três coisas ao mesmo tempo. Eu não tinha simpatia por ele e nem ele por mim, mas ainda bem que eu tinha marcado todas as questões corretamente, e como sabia disso? Estudei dois dias e três noites para fazer uma prova perfeita, mesmo com minha mente vagando pelo lado obscuro do crime. — Os resultados saem em duas horas
— disse, enquanto os outros alunos sem um pingo de esperança lhe entregavam as provas.
***
— Então, como foi a prova? — perguntou minha mãe quando me viu saindo e me aproximando dela.
— Fiz o melhor — falei, dando um abraço. Eu adorava o cheiro de seu perfume, e o sorriso sempre acolhedor que apenas ela tinha.
— Ei, cara! — gritou Antônio de longe.
— Sam... — minha mãe me olhou preocupada. — Seu pai não vai gostar de saber que você continua andando com o filho dos Ruffato. Ele não é uma boa pessoa, meu filho. Já conversamos sobre esse assunto, querido — ah! Se minha mãe soubesse o que de fato iríamos fazer juntos, ela teria um ataque.
— Mas eu o conheço desde o primário, mãe — tentei explicar o fato de ainda andar com ele, mas ela continuava me olhando preocupada, com aqueles olhos castanhos grandes e expressivos. — E eu sou o único amigo que ele tem... — dei de ombros, tentando amenizar as coisas, mas eu sabia que minha mãe também não gostava que eu andasse com ele.
— Tudo bem, mas não chegue tarde. Seu pai vai se atrasar hoje, mas não abuse da sorte. Não quero ter que ir tirá-lo de algum presídio — estremeci com a ideia da minha mãe entrando numa cadeia, o que me fez ficar de coração partido.
— Prometo não chegar tarde — respondi, beijando o topo da sua cabeça, ao me despedir. Então minha mãe seguiu para o seu carro. Um Chevrolet Belair 56 azul-celeste que sempre admirei por ser um clássico e por ainda não o termos vendido para pagar as contas.
— Você tem que conhecer os caras que armam a jogada. Eles querem ter certeza que você não vai amarelar — sugeriu Antônio, estalando a língua quando chegou perto de mim. Ele andava de um jeito esquisito e todos na faculdade o olhavam atravessado, isso quando não viravam o rosto para o outro lado. Ser aluno de arquitetura não era apenas status, era ter amigos ao nível do curso, mas ao contrário de muitos, eu sempre quebrei as regras nesse quesito. — Sabe como é, nada pode sair errado.
Agora era tarde para voltar atrás. Realmente tarde. Eu estava seguindo para um caminho que poderia não ter volta. Fiquei me perguntado: E se der algo errado? E se machucar alguém? Mas, e meus pais? Precisava ajudá-los de alguma maneira. Mesmo sabendo que aquilo que eu tinha escolhido, não era o certo a ser feito. Mesmo sabendo de tudo que o meu pai havia me ensinado, os conceitos de ser um homem honesto desde criança.
Ah! Se eu soubesse que me arrependeria, e muito.