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4

No elevador, sinto o meu peito se apertar com uma angústia sufocante que não consigo explicar. É como se algo muito ruim tivesse acontecendo nesse exato momento. Apresso os meus passos assim que as portas se abrem e entro no largo corredor do departamento de oncologia, mas quando me aproximo do quarto, vejo a minha amiga cabisbaixa e do lado de fora. Agitada, apresso ainda mais os meus passos, sentindo uma pontada desconfortável em meu peito. Angustiado, meu coração perde o seu ritmo.

— O que aconteceu, Mônica? — perguntei com um tom tão baixo, que não tenho certeza se ela me ouviu. Ela ergue a sua cabeça para mim e eu encontro os seus olhos molhados de lágrimas. — Por que você está chorando? Onde está a minha mãe? — pergunto com um desespero contido. Medo, estou afogada nesse sentimento agora.

— Os médicos a levaram, Ana — responde com o mesmo tom que acabei de usar. — Eu sinto muito! Ela passou mal e eu não sabia o que fazer. — Olhei nos olhos da minha amiga. Ela tinha uma expressão assustada e logo voltou a chorar, dessa vez me envolvendo em seus braços. Senti minhas barreiras já abaladas irem ao chão e eu desabei ali mesmo. Ficamos entregues à dor e a um silêncio doloroso por alguns minutos. — As máquinas começaram a fazer um barulho estranho e de repente os médicos e enfermeiras invadiram o quarto e eles me mandaram sair do quarto. — diz agora mais calma. — E eu… juro que não sei o que aconteceu, Ana. — Mônica volta a chorar, dessa vez silenciosa e ainda em seus abraços, me deixo levar pelo pranto e pela dor.

— Deus, me ajude, por favor! Deus, me ajude, por favor! — repito a oração em voz alta, como se fosse um mantra, na esperança de que tudo isso acabe logo. Eu não aguento mais tanta dor! Horas se passaram até que o Dr. Reinaldo Vilela, o médico que acompanhava a minha mãe em seus tratamentos desde o início, apareceu.

— Podemos conversar em meu consultório um minuto, Ana? — O seu semblante sério demais me deixou receosa. Hesito, ainda sentada no banco ao lado da minha amiga. Doutor Vilela aparenta ter seus quarenta anos. E apesar de ter os cabelos grisalhos e curtos, que lhe dão um certo charme, ele é um homem bem conservado. Seu semblante calmo transmite muita serenidade, mas faz um contraste grande demais com a sua voz grave e firme. Ele me convida a entrar em seu consultório. Receosa, eu puxo a respiração para tomar coragem e nesse momento, Mônica segura a minha mão e sussurra que estará aqui fora me esperando. Sei o que ele tem para me falar e não sei se estou preparada para ouvir as suas palavras. Não estou preparada para sua partida, não ainda.

— Não vou te deixar sozinha, amiga — repete e eu assinto. Então, impulsionada por uma força que desconheço, levanto-me do banco e o sigo em silêncio. Entramos em sua sala, que tem uma decoração moderna, alguns livros em uma estante e alguns quadros com fotos de sua família desportos sobre a sua mesa. Sinto os meus passos cada vez mais pesados, minhas pernas parecem pesar uma tonelada. Sento-me na cadeira em frente para sua mesa, para enfim ouvir o que ele tem para me dizer.

— Ana, as notícias não são nada boas. A sua mãe teve outra parada cardiorrespiratória. Ela está muito fraca e temo que se ela tiver outra parada dessas, acredito que não vá resistir — diz o seu prognóstico e me lança um olhar piedoso. — Querida, eu aconselho que fique preparada, porque ela pode ir a qualquer momento. Imagino que não será nada fácil, menina, mas temos que ser realistas. — Escuto o médico falar e falar, mas não presto muita atenção em suas palavras. Meu cérebro está girando e girando sem parar e minha mente está muito distante daqui. Estou pensando no amanhã e no meu futuro sem ela. Minutos depois, saio do seu consultório arrasada, acabada, sem forças, sem esperanças e sem chão. Meu mundo está desabando mais uma vez sobre a minha cabeça.

— O que será de mim agora? — pergunto para mim mesma. — Eu me sinto tão sozinha sem você aqui comigo, mãe. Por favor, não me deixe! — peço, encostando-me em uma parede, sentindo minhas pernas fraquejarem, até que caio de joelhos no chão, entregando-me mais uma vez à dor e às lágrimas que já não controlo mais. Sinto braços carinhosos me abraçarem. Mônica está ao meu lado como havia me prometido e chora junto comigo. Não havia necessidade de dizer-lhe mais nada, ela já entendera o que estava acontecendo.

— O que eu farei agora, amiga? — perguntei soluçando em seus braços. — Eu não sei o que fazer com essa dor aqui dentro do meu peito. Se ela me deixar, eu não saberei viver.

— Querida, eu sinto muito, mas você precisa ser forte agora. Por você e por ela também. Ana, a sua mãe precisa descansar, ela já não aguenta mais. Lutou o que tinha para lutar, mas tenha uma certeza na vida, ela não irá em paz se você ficar assim. — Suas palavras penetraram com suavidade em meus ouvidos. Ela tem razão, mas meu coração é egoísta demais para deixá-la ir.

— Deus, me ajude, por favor! Deus, me ajude, por favor! Deus, me ajude, por favor! — Repito a prece que fiz minutos atrás. —Mãe me ajude a suportar essa dor que é a sua partida — sussurrei um último pedido de socorro para a minha mãe, na esperança de que ela realizasse esse último desejo. — Eu te amo tanto! — digo soluçando. Mônica afaga as minhas costas, ainda abraçada a mim no chão e eu me deixo levar pelas boas lembranças.

— Mamãe, mamãe, cheguei! Cadê você, mamãe?

— Aqui na cozinha, querida! — Escuto a voz de mamãe e corro direto para o cômodo, mas surpreendida por uma mesa linda, toda colorida, com bolo, doces e muitos salgadinhos, e na parede tem um arco de balões coloridos. Assusto-me ao ouvir um grito coletivo de SURPRESAAAAA! e abro um enorme sorriso ao ver que todos lembraram do meu aniversário de sete anos. Todos estavam lá: Mônica, seus pais, sua irmã e minha mãe linda!

— Vocês lembraram! — falo dando pulinhos animados e batendo palminhas arrancando algumas risadas dos nossos amigos. Recebo o abraço e os parabéns de todos em seguida e dou muitos beijos na minha mãe. Pois, eu sei que foi ela quem preparou tudo isso para mim.

 — Obrigada, mamãe! Eu te amo muito, sabia disso?

— Também te amo muito, muito, muito e muito, meu amor! — Sorrio com a lembrança e penso que terei muitas assim para sempre lembrar dela.

— Obrigada por tudo, mãe! — sussurro para mim mesma. Decido que ficarei perto dela até o último instante e farei o que ela mais gosta: lerei, cantar e contar as boas lembranças que tenho dela, até que chegue o momento de sua partida. Algumas horas depois ela já estava estabilizada e eu pude voltar para o quarto. Minha mãe dormia serena em seu leito, até parecia um anjo. Chego perto da cama com cuidado e seguro sua mão. Sinto o seu toque gélido e quase sem vida. Ao lado da cama, um aparelho a ajuda a respirar e um outro, monitora os seus batimentos cardíacos. Acomodo-me na cadeira ao lado da cama, sem soltar a sua mão.

— Oi, mãe, lembra quando… — Começo a contar algumas das nossas lembranças felizes. Rose não esboça nenhuma reação, mas mesmo assim eu continuo. A noite passa e o dia chega de uma forma que eu nem percebo. Não consegui dormir. Fiquei quietinha, velando o seu sono e curtindo a sua presença enquanto eu podia. O dia se arrastou sofregamente, mamãe acordou algumas vezes, mas logo ela voltava a dormir. A noite seguinte seguiu tranquila e para a minha felicidade, Rose dormiu sem nenhum problema. Em algum momento da madrugada ela acordou e me pediu um pouco de água. Com cuidado a ajudei a tomar alguns goles e logo ela dormiu outra vez. Nessa mesma noite cantei a sua música preferida e nem percebi quando adormeci sentada com a cabeça apoiada no colchão, perto da sua mão.

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