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Capítulo 1

Trancado dentro de mim, observei Ovines forçados a dormir diante da minha já inútil presença. Eu deveria tê-la protegido daquele monstro que infestou sua vida, que roubou seu sono e seu sorriso. O barulho ensurdecedor das máquinas impediu que o fluxo dos meus pensamentos me matasse. Bati na coluna de apoio, encharcando-a de sangue e chamando a atenção dos médicos, que correram para dentro da sala, com medo de encontrar o agressor. Aquele bastardo acabaria onde merecia estar. Se ao menos tivessem me permitido sair e procurá-lo, eu teria tirado de uma vez por todas aquele sorriso de satisfação. Seus rostos roxos olharam nos meus olhos, opacos, vazios por causa do que havia acontecido. Temia que ela não voltasse a acordar, que aquelas safiras maravilhosas não dançassem mais com as minhas na dança mais importante: a da vida. Pela primeira vez na minha existência me encontrei à beira de um precipício. Se ela se fosse para sempre, uma parte de mim morreria com ela. Ele a afastou, ele a maltratou. Ele brincou com os sentimentos dela como o pior dos idiotas. Mas naquele momento absurdo, a verdade amarga não demorou a chegar. Eu estava com medo. Um medo inconsciente, ilógico e inconcebível de amar. Amá-la. Porque eu sabia que se me juntasse completamente a ela, isso duraria para sempre. Foi exatamente isso que me aterrorizou. Poderia um espírito livre como eu se entregar completamente a alguém?

Era um lindo dia de sol, com uma leve brisa bagunçando meus longos cabelos negros. Senti o cheiro de sal, típico dos spas, enchendo minhas narinas. Apoiando as mãos numa grade branca, com as costas ligeiramente para a frente, ele admirou as ondas. Pés descalços e corpo rodeado apenas por um manto transparente, que pouco deixava à imaginação. A paz que me embriagava só era igual ao amor que enchia meu coração. Fechei os olhos para saborear o ar da manhã, até sentir dois braços poderosos me envolverem. O cheiro forte do homem que me cercava com seus membros superiores era inconfundível, meu peito arfava ferozmente.

— Luca — me virei e o beijei suavemente, entrelaçando minha língua com a dele, em perfeita sincronicidade.

Eu o amava tanto que poderia ter vendido minha alma apenas por um sorriso dele. Ele era muito mais alto do que eu e extremamente atraente, seus músculos salientes sob a camiseta branca com a qual ele costumava dormir, seus olhos escuros focados nos meus e me tirando o fôlego. Seu queixo quadrado lhe dava uma aparência dura e suas mãos grandes e quentes eram meu refúgio. Minha altura só me permitiu alcançar seu peito, o suficiente para permitir que ele me abraçasse e me cercasse completamente.

—Pequeno—, apelido que ele usou para mim, foi maravilhoso ouvir o som de sua voz poderosa me chamando daquele jeito carinhoso.

Luca, um menino imponente, daqueles que inspiram medo. Muitas vezes ele se metia em problemas por causa de sua atitude agressiva e briguenta. Mas eu o amava. E eu o amava de verdade, pensei ter encontrado minha alma gêmea, a pessoa que ocuparia meu coração para sempre. Como quando você imagina o seu final feliz, você o vê perfeito, sem falhas. Você sonha com isso sem rachaduras, fissuras ou angústias repentinas. A realidade, porém, é bem diferente. Ele se infiltra com força, sem aviso prévio, e joga a verdade de volta na sua cara, esteja você disposto a aceitá-la ou entendê-la ou não.

De repente, o mundo ao meu redor escureceu, fazendo meu amado Luca desaparecer, deixando uma figura sombria e raivosa em seu lugar. Seu rosto estava distorcido de raiva, mudando quase completamente a imagem idílica que minha mente havia reservado para ele. Foi como um raio vindo do nada, como quando você sente que tudo é perfeito demais para ser verdade e espera uma catástrofe iminente.

- Eu sei. Eu sei que você me traiu. —Seu olhar era desumano, parecia que ele estava prestes a explodir como um meteoro.

— Luca… eu não fiz nada. —Sua figura parecia ficar cada vez maior, até que me senti como um rato preso.

"Você é apenas uma putinha que se diverte com todo mundo", seus olhos pareciam que iam sair das órbitas.

- Sabe que te amo. “Eu faria qualquer coisa por você”, eu disse, quase chorando. Quando eu ainda conseguia falar. Justo quando pensei que tudo acabaria, que ele perceberia que não precisava me tratar daquele jeito rude e intimidador.

Senti uma dor repentina e tudo começou a girar. Não consegui me concentrar no acontecimento, pois minha razão se recusava a dar espaço a um acontecimento desse tipo. Ele me deu um tapa, me fazendo tropeçar para trás. Ele havia usado toda a força de seu enorme corpo, sem perceber que eu era apenas uma mulher esbelta. Ele nunca tinha me tocado. Nunca. Ele era ciumento, possessivo e nervoso. Mas ele nunca se permitiria fazer isso. Ele não cruzaria essa linha, não comigo.

— Agora vou te ensinar como se comportar. — Aquela violência me deixou atordoado, desmaiado perto da grade, de onde pude ver as ondas azuis do mar batendo na costa. Queria desaparecer com eles, fugir daquela situação.

Não consegui reagir, minha cabeça latejava e não tive forças para me levantar, enquanto ele continuava a me encher de insultos e tapas. Ele repassou todas as vezes que saí sem a permissão dele, que o desobedeci, o desafiei, sem lhe dar motivos e me obrigou a olhá-lo diretamente na cara. Fechei os olhos pensando que certamente morreria.

Uma voz ao longe parecia chamar meu nome, me abalando profundamente. Parecia familiar e fiquei grato por ter acordado daquele pesadelo. Abri lentamente as pálpebras, revelando meu interlocutor.

—Foi um sonho, Gin. Você gritou como uma pessoa desesperada. Manuel inclinou a cabeça e olhou para mim interrogativamente.

Não consegui falar. A lembrança dos golpes que Luca me deu no corpo ainda parecia ecoar na minha cabeça. Os insultos que ele me dirigiu foram ainda piores do que a própria violência.

Voltei ao presente, estava deitado na cama com Manuel. Pisquei, como se quisesse ter certeza de que realmente estava naquele lugar, naquele momento. Meu quarto era uma profusão de cores e fotografias espalhadas por toda parte. Bastante amplo, com um enorme armário colocado ao fundo, também coberto de estampas. A mesa ficava no lado esquerdo da sala, coberta com minhas roupas e meus livros da faculdade.

Manuel estava de frente para mim, deitado de lado, com o braço esquerdo apoiando-o. Todas as meninas o consideravam atraente, ele tinha olhos castanhos muito penetrantes e traços fortes. Seu físico era esguio, mas bem proporcionado e tonificado. Seus cabelos escuros, levemente cacheados, caíam levemente sobre seu rosto, dando-lhe um toque muito particular. Ele tinha uma barba desgrenhada, tanto que parecia muito mais velho do que realmente era.

Ele era o melhor amigo com quem sempre sonhei, parecia ser a outra metade do meu coração: tão parecido mas ao mesmo tempo oposto. Ele sabia tudo sobre mim, cada pensamento, desejo ou humor. Foi como conversar consigo mesmo, sem saber, porém, como suas dúvidas se refletirão na pessoa que está à sua frente. Como sempre, encontrei-o ao meu lado no momento certo para me dar aquele choque que eu tanto precisava. Sempre foi assim, ele parecia ser o guia dos meus dias.

Ele gaguejou, enquanto eu estava perdido nas profundezas da minha mente: "Querida, você está me ouvindo?" ele gritou, fingindo uma cara ofendida, franzindo delicadamente o nariz.

— Manu, me desculpe, estava pensando — respondi após um longo silêncio. Os piores pesadelos aconteciam constantemente quando eu menos esperava.

—Não me diga que você ainda está pensando naquele desgraçado, terei te apresentado a pelo menos uma dúzia de amigos. Ele estalou a língua em desaprovação.

Balancei a cabeça nervosamente e sussurrei gravemente: — Manu... não consigo mais dormir... sempre vejo ele. Suas surras. Sua violência. Tirou algo de mim... não sou mais o mesmo... tenho medo de enlouquecer... —

Ele olhou para mim, suspirando. Eu odiava trazer à tona meu passado. — Ovinos, você é a pessoa mais forte e teimosa que conheço. Você não vai deixar esse pedaço de merda te derrubar. —Ele cerrou a mandíbula.

Meus instintos sabiam de cor suas expressões. Anoiteceu quando essas atrocidades horríveis voltaram à tona, atormentando-me. Eu me vi coberto de traumas e feridas. Ele curou aqueles que não eram visíveis a olho nu. Eu não conseguia imaginar um único momento sem tê-lo ao meu lado. Minha vida se tornou um verdadeiro pesadelo. Estar por muitos anos com uma pessoa que adora fazer você se sentir mal em tudo que faz, em tudo que você é, marca sua alma como um fogo evanescente. Sem mencionar as surras que fraturaram meu corpo e minha mente.

— Obrigado, minha rocha sólida. — Coloquei as mãos atrás do pescoço, como se quisesse apoiar minha figura magra. Estudei-o sorrindo: ele me salvou do mundo e de mim mesmo. Eu teria agradecido a ele por toda a minha existência e talvez até além. Meu mundo não desabou só por causa daquele indivíduo que me olhou com ar divertido.

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