Capítulo 4 — MICHAEL
Michael Williams:
A sensação de proteção era algo que me dominava desde criança. Eu não conseguia ver uma pessoa sofrendo e ficar quinta, era como se eu estivesse virando as costas para mim no passado. Émie estava visivelmente necessitada de ajuda, em seus olhos já não havia mais brilho. Seu semblante era de profunda tristeza e solidão, e aquilo de certa forma, me incomodava. Mesmo ela me pedindo para deixá-la ir sozinha até sua casa, eu não consegui.
Alguns minutos depois estava eu, parado de frente a sua casa, suspirei forte antes de bater em sua porta novamente…
— Olá, querido. — sua mãe abriu com um largo sorriso no rosto. Suas pupilas dilatadas indicavam que ela estava altamente drogada e fora de si.
— Boa noite! Eu preciso de mais um favor seu, pagaria bem se pudesse o fazer agora. — seu olhar foi direcionado ao meu bolso, como se a gente estivesse falando a mesma língua.
— Se eu puder…
— Quero que diga a Émie que estou aqui. Ela sabe quem eu sou! — e o sorriso que estava em seu rosto, desapareceu de uma forma instantânea.
— Sinto muito, mas não posso. Émie não está em casa.
— Sim, ela está! Eu a vi entrando, a senhora irá chamá-la por vontade própria, ou eu entraria aí e tirarei minhas próprias conclusões, Sra. Carter.
— Não será necessário nenhuma das alternativas, estou aqui. — sua voz doce e melancólica era como se fossem o cântico dos anjos em meus ouvidos. — Então, o que você quer conversar comigo? — seu olhar se manteve preso ao meu, e como se ela conseguisse me dominar, ali estava eu, parada e sem reação diante daquela homem.
— Aceita jantar comigo? Eu prometo que será algo que… — antes que eu terminasse o que estava dizendo, ela apenas aceitou e saiu, deixando sua mãe para trás e suspirando fundo.
O vento frio lhe causava arrepios. Seus cabelos voavam como se fossem fios de seda ao vento, a lua refletia em sua pele um brilho surreal.
Retomei os sentidos quando chegamos em frente ao meu carro, onde ela parecia estar perdida, com o olhar mirando algo aleatório.
— Vamos? Perdão por não me apresentar antes, prazer, Sr. Williams, mas pode me chamar de Michael! — ela me olhou como se já soubesse quem eu sou e de forma natural, sorriu e voltou a olhar para o nada.
— Eu não posso sair com você. Temos posições de status diferente, e não quero que se sinta na obrigação de ser gentil comigo pelo que aconteceu. Está tudo bem, eu estou bem, por favor, não se meta em problemas. — havia desespero em sua voz, como se fosse capaz a sua voz transmitir a dor de sua alma.
— Não estou me sentindo na obrigação de nada, apenas estou a convidando para jantar comigo como sinal de gratidão pelo bom atendimento de hoje mais cedo. Por favor! — abrir a porta e sem hesitar ela entrou.
— Que não seja um local com muitas pessoas. Por favor! — sua voz carregada de timidez me deixava de certa forma diferente. Sentia medo por ela; medo que ela fosse embora ou sumisse e isso tão de repente.
Estar ao seu lado, era como se estivesse sozinho, mas a sensação de que ela estava ali me confortava. Escolhi um restaurante reservado, antes que entrássemos pedi para fazerem uma reserva na área vip, onde já não havia acesso além dos que contratavam. Ao entrarmos, Émie parecia deslumbrada com tudo que estava vendo. As imagens de pinturas italianas davam um toque especial no lugar. Beatrice estava pitada em uma cerâmica que ficava acima do teto, e foi então que Émie se viu completamente hipnotizada. Pela primeira vez vi seus olhos brilharem, como se estivesse vendo o paraíso.
— Esse lugar é lindo! — seu tom de voz baixo e em tom de sussurro, deixou explícito o quanto ela realmente estava surpresa com tudo aquilo. — Sr. Williams, isso tudo é…
— Amores fictícios podem criar vida, sabia? — na verdade eu não acredito em amores reais. Ao meu ver, é um sentimento que serve apenas para te levar ao fundo do poço de forma mais lenta e dolorosa. Com a sensação de como estivesse caindo de cima de um penhasco.
— Não acredito no amor. Quais benefícios ele te trás a não ser ilusões e dores? — ela me olhou sem graça quando puxei a cadeira para que ela sentasse. — Obrigada!
— Ao meu ver, o amor tem que ter limites. As pessoas o esbanjam como se fosse a coisa mais bela do mundo, e que, se é ofertado de forma errada, sem dúvidas não causará bons resultados. Veja a relação de uma mãe e um filho, ao seu ver, lhe falta amor?
— Por favor, Sr. Williams não vamos entrar neste assunto agora. — às vezes eu deveria me castigar por certas coisas que falo.
— Perdoe-me, Srta. Carter, não foi minha intenção. Eu…
— Tudo bem. Falamos muitas coisas sem ser de nossa intenção!
Encontros não era algo que eu sempre tivesse. Como professor, tive algumas reuniões com alguns alunos após a aula para reforçar algumas coisas, mas nada que passasse disso.
Ela parecia não estar muito bem. Seus lábios estavam pálidos, sua pele arrepiada e ela continuava com o seu olhar perdido.
— Tem alguma coisa que gostaria de dizer? Não quero parecer que estou forçando alguma coisa, mas, também quero conhecê-la e quem sabe nos tornamos amigos.
— Oh, não queria que pensasse desta forma, não é nada disso. É só que… eu não tenho muito o que falar sobre mim, minha vida é uma monotonia. — seu jeito de falar era negativo, como se alguma coisa a incômodas bastante em silêncio. Suspirei e não desisti, esperei até que ela mudasse de ideia. — Bem… eu levanto todos os dias bem cedo, vou para o trabalho, às vezes faço até algumas horas extras e assim acabo passando o dia inteiro dentro daquela biblioteca. E é assim todos os dias.
— Não sente vontade de fazer alguma coisa diferente? Não se sente presa ou limitada a tais coisas?
— Sim, sinto que sou limitada a fazer as coisas que eu gosto. Mas nem todo mundo é igual, a maioria das pessoas apenas sonham mesmo.
— Srta. Carter, sua forma de expressão é extremamente dolorosa e fria.
Olhando pelo lado oposto, eu também não era muito diferente. Demonstração de sentimentos era algo difícil para mim ainda, desde os traumas que vivi no passado!
— Gentil da sua parte em falar o que pensa sobre as pessoas. Eu particularmente não gosto, às vezes a pessoa pode ser assim por algum motivo, antes que pergunte, não tenho motivos e não me acho uma pessoa fria, Sr. Williams.
Fiquei sem palavras e também não quis acabar com aquele momento. O garçom não demorou para trazer nossos pedidos e nem mesmo me importar com a hora. Émie parecia estar despreocupada, como se não se importasse com nada, embora sua mãe quase não me deixou vê-la. — Droga! — Praguejei ao ver que já se passavam das duas da manhã.
— Você não teria horas para voltar para casa? — perguntei olhando sério, assim não iria parecer que eu estivesse brincando ou zoando. Seu suspiro pesado foi o suficiente para que eu percebesse o quão cansada aquela garota estava.
— Felizmente não, afinal, qual diferença faria, já que quando eu chegar já irão estar dormindo, ou nem estarem em casa. Meus pais são problemáticos, e por isso quanto mais tempo longe de casa, melhor será para mim mesma.
— E por que ainda não saiu?
— Não é óbvio? Oras, não sair ainda porque não tenho dinheiro suficiente para me manter em uma casa sozinha, ao menos ainda não pago aluguel. Nem sei porque estamos tendo esta conversa, parece até que nos conhecemos há anos.
Minhas suposições se confirmaram, ela é apenas uma alma que sentia necessidade de falar sobre suas dores com alguém, só não sei se isso irá ser bom. Além disso, parece que nós nos conhecemos mesmo a muito tempo, ela me olha como se me compreendesse mesmo que eu ainda não falasse nada.
— Fico feliz que confiei em mim, se precisar de um amigo estou aqui. — toquei em sua mão e me senti feliz quando ela alisou minha mão também.
— Obrigada, Sr. Williams, saiba que lembrei disso algum dia.
— Por favor, me chame de Michael, afinal, a partir de hoje somos amigos.
Estava tarde, e eu precisava descansar, teria que entregar um relatório de um aluno de manhã cedo, mas não queria lhe deixar ir e ela também não se importava com o horário.
— Émie, se não se importa, a deixarei em sua casa e irei me despedir por hoje. Foi um prazer jantar com você, espero que aceite meus convites mais vezes.
— Tudo bem, eu ficarei grata se fizer isso.
Seguimos caminho até a sua casa, e não fui embora até que abrissem a porta, coisa que não aconteceu. Não poderia deixá-la ali sozinha, havia som ligado dentro da casa, um cheiro forte de maconha e as luzes todas apagadas. Senti muito por Émie ter que conviver em um ambiente tão deprimente como este. O vento estava forte, estava trovejando muito e ela insistia para que eu fosse embora, pois iriam abrir e ela iria entrar logo logo… mas vinte minutos se passaram e ninguém veio, ela então sentou e abaixou a cabeça.
— Por favor, venha comigo, não acha horrível esse cheiro de maconha e essas luzes ridículas? Olhe para você, isso não é ambiente para se morar. Vai chover, não quero que fique na chuva, pode pegar uma virose ou algo pior. Por favor? — com um olhar triste ela segurou minha mão e levantou-se.
— Tudo bem, mas saiba que eu irei retribuir o que está fazendo por mim, Michael. — finalmente ela estava confortável e admirava a paisagem enquanto estávamos indo para minha casa.