Capítulo 7
- Quero uma patrulha para verificar imediatamente o que está acontecendo na fronteira leste. Agora! - Os muros tremeram e até Karla sentiu que algo estava errado. Ela acordou tarde naquela manhã e encontrou um post-it de Juan no travesseiro ao lado do seu. Ele era um viking duro e anguloso que nunca mostrava sua verdadeira personalidade para as pessoas ao seu redor. No entanto, ele sempre foi gentil e atencioso com ela, conseguindo quebrar os padrões que ela imaginava que ele pudesse ter. Na semana que passaram juntos, ela teve a oportunidade de descobrir esse lado do caráter dele e muito mais. Eles passaram todas as noites conversando e contando histórias de suas vidas, descobrindo que eram opostos, mas que, inexplicavelmente, conseguiam se dar bem. John tentou abrir espaço para si mesmo e para seu parceiro, tentando estar presente pelo menos à noite, durante o jantar. Ele estava aprendendo a administrar mais de uma coisa ao mesmo tempo, e estava se saindo muito bem nisso. Karla havia descoberto mais sobre o mundo das criaturas sobrenaturais, aprendendo que os lobisomens não eram os únicos lobisomens, havia também leões, onças e panteras. Ela havia lido muitas histórias sobre o sobrenatural e amado muitas outras, mas ainda estava alarmada ao descobrir que tudo o que ela pensava ser fantasia era, na verdade, a vida cotidiana no próprio mundo. Ela se sentia como se estivesse vivendo em um seriado de televisão, do tipo que ela sempre gostou tanto, pela adrenalina que lhe proporcionava, mas isso não era fantasia de algum diretor, e Karla logo descobriria isso à sua custa. Ela tomou o café da manhã com panquecas recheadas com xarope de bordo e frutas frescas, depois voltou para o quarto e vestiu algumas das roupas de John. Ela estava perambulando por aquele apartamento vestida como um homem há uma semana. Não havia muito que ela pudesse fazer com as roupas, mas certamente não passaria mais nenhum dia andando por aquela casa. Durante seis dias, ela limpou tudo o que podia naquele apartamento, tentando fazer com que os dias passassem. Ela prendeu o cabelo levemente ondulado em um coque bagunçado e saiu da casa que dividia apenas com John. Ela desceu os dois lances de escada de madeira e se viu na sala comum no andar de cima. Ela olhou em volta com curiosidade e notou que havia vários lobos presentes. Alguns deles se viraram para ela e abaixaram a cabeça levemente em sinal de respeito, sem fazer gestos excessivos, e Karla, de certa forma, ficou grata por isso. Caso contrário, ela não saberia o que fazer. Ela vagou pelos intermináveis cômodos daquela casa e pelos vários corredores por mais alguns minutos, depois sentiu alguém bater em seu ombro, fazendo-a se virar.
- Minha Luna, você não pode ficar aqui. - Esse era Sergei, o beta de Juan e também seu melhor amigo. Ela o conhecera alguns dias antes e ele parecia uma alma muito parecida com a de Juan, embora ela ainda não tivesse descoberto o motivo pelo qual não conseguia ler a aura de seu parceiro. Sergei era fácil de ler, tanto que imediatamente se afeiçoou a Karla,
- Olá, Sergei, você pode me dizer onde posso encontrar Juan? Preciso lhe perguntar uma coisa. - Karla ignorou completamente o que Sergei acabara de lhe dizer. Na verdade, ele levantou uma sobrancelha e depois sorriu um pouco. Aquela garota nunca, jamais, faria o que ele lhe dissesse, ele entendeu isso desde a primeira olhada. Ela era uma alma livre e dominante, não teria sido ensinada tão facilmente.
- Claro, venha comigo. - Enquanto isso, Sergei se comunicava com seu Alfa sobre o que estava acontecendo, por meio do elo mental que unia cada lobo. Eles chegaram em frente a uma porta totalmente preta, que parecia bastante antiga e pesada. Ela destoava um pouco do resto da casa, embora tudo fosse bastante antiquado em comparação com o apartamento do Alfa. A porta se abriu logo em seguida, sem que ninguém a tocasse, revelando o interior de um escritório onde a ordem reinava suprema. Sentado atrás de uma sólida escrivaninha de madeira estava John, ocupado lendo alguns papéis. Assim que a porta foi totalmente aberta, o líder da matilha olhou para sua companheira e sorriu. Só o fato de vê-la o fazia se sentir vivo.
- Obrigado, Sergei. - O Beta acenou com a cabeça e desapareceu atrás da porta do escritório, que estava prestes a se fechar sozinha.
- OLÁ. - Um sorriso tímido surgiu nos lábios da garota. Ela havia sentido falta dele e só se deu conta disso agora, olhando em seus olhos.
- HOLA. - respondeu Juan, levantando-se de sua cadeira. Embora tivesse outras coisas em mente, ele sempre arranjaria tempo para ela. Ela era sua companheira, sua razão de viver no momento.
- Eu queria passar aqui e perguntar se eu poderia comprar algumas roupas para mim. Eu iria para casa, mas você me explicou o que aconteceria se eu fosse, então... - Karla deu de ombros, sem saber o que dizer. Ela sempre se sentia tão estúpida quando falava com Juan. Ele era o oposto dela. Sedutor, confiante, aberto a fazer novas amizades.
- Eu a levarei para a cidade mais tarde. Agora me desculpe, não quero ser rude, mas tive alguns problemas e preciso resolvê-los. - Sergei acabara de lhe dizer que a equipe enviada para a fronteira leste havia capturado o intruso e estava voltando para a casa de carga.
- OK, obrigada, posso ajudá-la a resolver esses problemas ou devo ir embora? - Ela tinha medo de ser muito intrometida, nunca foi de seu feitio fazer muitas perguntas, mas desde que conheceu Juan ela era uma pessoa diferente. Seu corpo a impulsionava a fazer o que ela nunca faria. Era como se ela tivesse se tornado mais impulsiva, mais reativa, mais impetuosa.
- Sem Karla. Ir para o apartamento. - E era o que ela queria fazer, com todo o seu ser, mas era o que ela nunca fazia. Juan saiu do estúdio dois segundos depois, deixando-a sozinha. A garota olhou um pouco ao redor e então decidiu sair do local e fazer o que lhe foi pedido. Ela não sabia exatamente quando mudou de ideia, mas foi somente quando se viu do lado de fora da casa que percebeu que não estava no apartamento. Impulsionada por uma força interior, ela caminhou até o pé do que poderia ser considerado uma arena, mas escavada no chão. Um grito alto veio de lá e Karla, cheia de curiosidade, entrou no local, ignorando mais uma vez o que John havia lhe dito. O local estava cheio de pessoas, e ela supôs que eram todos lobisomens. No centro da arena estava John, em frente a um homem ajoelhado, com o rosto marcado por cortes, sangue e hematomas. Silenciosamente, sem ser notada, Karla chegou em frente ao programa que estaria prestes a ir ao ar se ela não tivesse chegado.
Juan sentiu que algo estava errado. Ele olhou para cima e viu sua parceira entrar no ringue da arena e se aproximar dele. Ele imediatamente baixou a adaga e olhou para o homem. Quando Karla chegou ao seu lado, ele a encarou por alguns minutos e então decidiu falar.
- O que está fazendo? - O tom de sua voz era parte surpresa, parte raiva. Que diabos sua esposa estava fazendo e por que ela não estava em casa?
- Quem é esse homem? - Em sua mente, Karla estava lendo a aura do homem curvado sobre seus joelhos. Ela estava com medo, mas sentia que algo sobre esse homem seria útil para a matilha de John e para ela também. A multidão na arena, que antes torcia pelo seu Alfa, agora estava em silêncio, esperando que algo acontecesse. Sua aura não era mais tão clara como antes, parecia modificada, escurecida.
- É o intruso. - John respondeu, levantando uma sobrancelha para seu parceiro. Ele não tinha ideia do que estava fazendo e não conseguia nem mesmo impedir. Embora ela ainda não tivesse passado pelo rito de passagem para se tornar parte da matilha, Karla era, em todos os sentidos, sua Luna. Enquanto isso, a garota havia mudado diante dos olhos de todos, mas sem que ninguém percebesse. Seus olhos, que antes eram da cor do céu, agora estavam vermelhos, vermelhos como o fogo.
- Sim, ela é. Mas também é outra coisa. Diga-me, Isak, o que você está fazendo aqui? - Karla contornou o homem que ainda estava ajoelhado, mas que havia levantado a cabeça em direção à garota ao ouvir seu nome. Ao contornar o homem, Karla pegou a adaga da mão de Juan. Era de prata.
- Como você sabe meu nome, vadia? - Isak não era um homem qualquer. Os olhos de Karla ficaram mais vermelhos diante da pergunta indelicada. Um golpe forte, no rosto. Um longo corte agora marcava o rosto de Isak. Juan não conseguia acreditar em seus olhos, essa garota era uma surpresa. Ele não achava que fosse possível machucar nem mesmo uma mosca e agora, em vez disso, tinha acabado de marcar o rosto de um homem para o resto da vida.
- Não é legal da sua parte falar comigo desse jeito. Vou perguntar mais uma vez: o que você está fazendo aqui, Isak? - Karla parou exatamente na frente do rosto de Isak e se inclinou sobre as pernas dele, olhando-o diretamente nos olhos, sem medo. Os olhos de Karla ainda estavam ardendo. Isak tinha medo de olhar para ela. Não podia ser, não podia ser ela. Os dois únicos espécimes criados haviam escapado dos laboratórios décadas antes, deviam estar na casa dos cinquenta anos, não na dos vinte, como a mulher à sua frente! Não era possível, nada disso era possível. No entanto, ela estava lá.
- Estou aqui porque tenho que falar com o Alfa e a Lua da matilha. - Karla olhou para John, que havia cruzado os braços, visivelmente não acreditando em nenhuma das palavras que saíam da boca de Isak. Todas as pessoas na arena pareciam hipnotizadas pelo que estava acontecendo e por sua Luna.
- O que você tem para falar conosco? - Mas o que mais surpreendeu Juan foi Karla. Ele nunca imaginou que ela pudesse ser assim. Ela parecia ter um temperamento diferente do habitual, mais inclinada ao confronto e à violência.
- De um projeto. O Projeto J.N. -