Capítulo 3: Serpente
-Calem a boca ! Gritei nervosa enquanto as três tagarelavam na minha cabeça.
Não prestei atenção, não percebi o carro da frente parar na cancela do estacionamento, quando me dei conta já tinha batido na traseira dele.
Fiquei imóvel segurando o volante com as duas mãos e vendo aquele homem grande e forte esbravejar enquanto dava tapas no capô do meu carro.
Nisso elas se calaram... Só a Angel foi capaz de ficar comigo e me ajudar a falar calmamente com aquele homem.
-Me desculpa ! Eu me distraí por um momento, não vi que estava tão próximo... Não se preocupa, eu pago tudo.
Falei descendo do carro e sentindo meu corpo todo tremer.
Quando ele percebeu que era uma mulher quem havia batido no carro dele se acalmou, baixou o tom de voz e me perguntou se eu estava bem...
Nesse momento eu reparei na beleza daquele homem alto, corpo atlético e um olhar profundo.
Cara a cara com ele, escutei minha voz interna gritar "gostoso" dentro da minha cabeça.
Enquanto ele anotava meu contato, eu o admirei e meus pensamentos vaguearam em construir castelos.
Ele é ruivo e eu sempre fui louca para ser mãe de uma menina ruiva... Pensei enquanto o analisava detalhadamente.
Pronto ! Resolvido o problema da batida... Ele vai mandar consertar, eu vou pagar e acabou.
Meu desejo dizia ao contrário, acabei de provocar um acidente, mas eu estava feliz, pois agora ele tem como me achar.
Foi só entrar no carro para que a reunião de tagarelas voltassem a se manifestar.
Gravei a placa do carro e o cheiro do perfume dele está tão forte na minha lembrança que ainda posso sentí-lo.
-Otávio ! O que será que ele faz ? Tava bem vestido, social, blazer de alfaiataria... Mas percebi tatuagens nas mãos, ante braços e no peito, acima da gola da camisa justa o suficiente para marcar os músculos.
-Não parecia um executivo com aquelas tatuagens ! Disse a Fernanda colocando suas regras sob um cara que acabamos de conhecer.
-Que nada a ver, as pessoas tatuadas podem ser o que quiserem ! Retruquei em voz alta.
-Gosto de tatuagens ! Opinou a pequena
-Eu gosto é daquele corpo tatuado. Lú mais uma vez dando o ar da graça.
Eu tinha mandado um "oi" mas ele não mandou nada de volta.
Já havia passado mais de uma hora do contratempo quando ele me ligou, mas de um número fixo.
- Natalie ? Aqui é o Otávio, tudo bem ? Estou ligando para perguntar se você se acalmou ? Não consegui nem mandar mensagem antes, estava numa apresentação de escola da minha filha...
-Boa noite ! Sim, eu estou bem... Obrigada por perguntar. Você tem uma filha ? Que legal, qual a idade dela ?
Perguntei já pensando no fato dele ser casado, ter esposa e filhos.
- Tenho sim ! Ela tem cinco anos e se chama Leonora.
- Que nome forte ! Lindo.
-Para minha sorte eu ganhei no par ou ímpar da mãe dela, senão a coitadinha chamaria Belinda.
-Eu acho bonito também.
-Significa "serpente". Respondeu
-Nossa... Então você está certo em não querer esse nome na sua filha.
-Ela é tão doce, tão fofa que em nada combinaria com uma cobra.
-Se bem que eu gosto de cobras ! Mas realmente não combina com uma menininha.
-Gosta de cobras ? Sério ? Geralmente mulheres tem pavor...
-Eu gosto, na verdade não tenho problemas com nenhum dos animais que causam repulsa nas mulheres, exceto por aranhas ! Tenho fobia, pânico... Mas sapos, cobras, ratos e morcegos não me incomodam em nada, acho todos bonitos.
-Que diferente ! E interessante.
-Me desculpa novamente pelo seu carro... Ainda não acredito que bati em você parado.
-Acontece ! Fica tranquila.
- O ruim é o transtorno que eu vou fazer você passar... Ficar dias sem carro.
-Não me incomoda, o tanto que eu trabalho, acabo usando o carro bem pouco, geralmente uso a viatura.
-Viatura ? Você é policial ?
-Sim, delegado !
- Eu fiquei pensando em qual profissão você poderia ter, mas não pensei nem de longe em delegado.
-Pois é... Sou delegado há oito anos já.
-Nunca conheci um delegado...
-Agora conhece ! Eu também fiquei me perguntando sua profissão sabia ? Tão impecávelmente vestida e maquiada.
-Eu sou diretora financeira de uma rede de farmácias.
-Olha só a coincidência....
-Qual ? Perguntei surpresa.
-Também nunca conheci uma diretora financeira ! Falou rindo.
-Agora conhece ! Respondi com as mesmas palavras dele.
-Gostei de conhecer. Respondeu
Eu senti meu coração disparar nesse momento.
-Eu também gostei de conhecer um delegado ! Respondi repetindo as palavras da Luíza que estavam ecoando dentro de mim.
-Desculpa a pergunta e me perdoe se achar invasiva, mas você é casada ?
-Não ! Solteira e você ?
-Divorciado !
Um alívio tomou conta de mim e ao mesmo tempo me perguntei se era sério que eu estava feliz por ele não ser comprometido.
-Tem filhos ?
-Não também ! Solteira e sem filhos... Antes eu não queria ter, após completar 30 anos, comecei a considerar a possibilidade de uma produção independente.
-Sério ? Não prefere o método tradicional ?
-Sim, claro que sim ! Porém eu estou solteira há mais de um ano, então o método tradicional está um pouco fora de cogitação no momento.
-Tá nada, só você procurar direitinho um candidato.
-Você só tem a Leonora de filha ou tem mais ?
-Somente ela, nas pretendo ter mais uma, se Deus quiser ! Quero ser pai da Tamara ainda.
-Já tem até o nome ? Que legal... Você tem bom gosto para escolher inclusive.
-Gosto desse nome ! Faz mais de dois anos que escolhi... Ainda tava casado e queria uma segunda filha, mas não deu certo.
-Porque separou ? Se quiser falar é claro...
-Meu trabalho ! Ela alegava muita ausência minha... Agora ela tem outro namorado que trabalha online de casa, e está grávida novamente, segundo a Lelê me contou hoje.
-Gosta dela ainda ?
-Não mais...
Percebi que estávamos a um tempão conversando e que eu já estava invadindo muito a privacidade dele, parei de perguntar sobre a ex.
- Bom, eu também já tenho o nome da minha filha pré definido... Quero Maitê.
-Se eu fosse o pai da sua filha, iríamos tirar no par ou ímpar também ! Retrucou.
-Se você me desse uma filha ruiva, até te deixaria colocar o nome que quisesse.
Falei isso no impulso e senti meu rosto queimar... Sorte que não estávamos cara a cara.
-Se você me desse essa oportunidade... Podia chamar Maitê mesmo, já gosto até mais do que Tamara !
É impressão minha ou nós estamos flertando ? Pensei e um sorriso enorme enfeitou os meus lábios.