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Capitulo 5

Bruno encara Helena, pensativo. Nem em um milhão de anos imaginaria que aquela doce garota havia passado por tudo aquilo. Ela se vira em direção a ele e lhe entrega seu melhor sorriso em meio a dor que tomava conta de seus olhos. Helena volta encarar o mão e então sente a mão de Bruno segurar a sua em meio a areia. Ela continua encarando o mar, pois se voltasse a encarar Bruno sentia que as lágrimas tomariam conta de seu rosto e isso Lena não estava disposta a permitir. Chorar na frente de um estranho? Nem em um milhão de anos! Aos poucos os dedos de Bruno se afastam dos seus e ele volta a se virar em direção ao mar, em silêncio. Eles ficam assim por alguns longos minutos, até que Bruno respira fundo e pergunta:

— Então você decidiu vir a essa viagem para tentar convencê-lo que não é essa pessoa que ele a acusou de ser?

—Não. - Nega Helena balançando a cabeça , sorrindo. — Na verdade, seria até um motivo óbvio, mas não...

— Veio por que as passagens não eram reembolsáveis e decidiu que não ia perder esse dinheiro? - Questiona Bruno tentando adivinhar o que fez Helena vir para sua cidade.

—É um bom motivo, mas não. Pelo contrário, eu ainda gastei mais trazendo meu irmão e minha mãe comigo.

— Hummmm... - Solta Bruno pensativo. Ele analisa Helena dos pés a cabeça e então arrisca mais uma vez: — O traje, a loja onde comprou não aceitou a troca porque passou da data. Aí você ficou com um traje de ciclismo sem propósito algum de usar e decidiu vir.

—Eu fiquei com dois trajes, pois comprei o dele também. - Corrige Helena observando a expressão de alegria de Bruno por achar que havia acertado. —Porém, não, não foi isso que me fez vir até aqui. Apesar de eu ter o traje dele ainda em minha mala. Se quiser, posso dar ele pra você... se servir.

—Obrigado. - Agradece Bruno encarando Helena que volta a observar o mar. Sua curiosidade não permite que ele desista de perguntar o que trouxe Helena até Parati. Ele empurra Helena com seu ombro e pergunta: — Então, o que fez você vir para cá?

—Você. - Responde Helena, tranquilamente.

— Eu? - Pergunta Bruno em choque com a revelação.

Sua cabeça fervilhava tentando imaginar quando foi que havia se encontrado com Helena e a convidado para vir para Parati. Ele tenta de todas as formas puxar na memória enquanto se promete a nunca mais falar com qualquer mulher se não estiver sóbrio. Bruno encara Helena e então não resiste e pergunta:

— A gente já se conhecia?

— Não! - Solta Helena rindo. — Não, na verdade não foi bem você, mas a sua loja quando me responderam sobre meu cancelamento. Vocês me enviaram um e-mail dizendo: "Não deixe seu coração partido impedir de conhecer os nossos serviços. Acredite, você vai se apaixonar."

— Gabriel. - Solta Bruno balançando a cabeça, inconformado. Ele encara Helena e então conclui: — Você era a noiva do e-mail que o Gabriel respondeu. Eu sinto muito.

—Não sinta. - Responde Helena tocando no ombro de Bruno.

—E então? Estávamos certos? - Pergunta Bruno, curioso.

—Veremos. - Disse Helena se levantando. Ela limpa a areia de sua roupa. — Acredito que há muito mais que deseja me mostrar...

—Sim, há muita coisa. - Fala Bruno se levantando.Ele se aproxima de Helena e diz: —Porém, não tem graça mostrar tudo de uma vez...

—Não?

—Não. Afinal, a melhor paixão é aquela que surge aos poucos. - Explica Bruno tão perto de Helena que a qualquer respiração seus corpos se tocaria. Ele ajeita os cabelos dela que continua encarando o rapaz. — Nos detalhes... nos gestos.

—Mas eu não quero me apaixonar. - Afirma Helena dando um passo para trás. — Eu não vim aqui para isso.

— Não? - Questiona Bruno.

— Eu só vim aqui ver o que seria capaz disso.

—Melhor ainda. - Afirma Bruno revestindo seu rosto do seu sorriso sedutor. — Assim o passeio fica mais interessante.

—Aposto que sim. Então, vamos? - Pergunta Helena caminhando em direção as árvores. — Acredito que ainda haja mais alguma coisa para vermos hoje.

— Sim, mas primeiro preciso te perguntar: que tal desagofar suas lágrimas no melhor alambique da região?

—Você está me chamando para beber no meio do dia? - Questiona Helena, surpresa, enquanto destrava sua bicicleta. — Isso que é atendimento personalizado!

— Bom, já que você não quer se apaixonar... Melhor ir de manhã. - Explica Bruno, encolhendo os ombros. — Agora se você mudar de ideia, a gente pode ir no final da tarde, próximo da noite...

— Vamos agora. - Aceita Helena colocando seu capacete.

Bruno e Helena voltam a pedalar até entrarem em uma estrada de terra esburacada e com subidas por todo os 1,5km do percurso. Helena acha essa estrada um espetáculo à parte ao se ver rodeada de muito verde e dos passáros.

Quando eles chegam ao local, um sítio , Helena se sentiu no paraíso, pois a vista do lugar é incrível com a mistura do campo com a prainha à beira-mar no final do sítio. A loira sentiu uma boa energia ao descer de sua bicicleta , somado ao barulho da máquina trabalhando e aquele cheiro bom de cana no ar.

— Esse sítio é o Santo Antônio. - Informa Bruno atraindo atenção de Helena. Ele se aproxima ficando atrás dela e então segura no braço de Helena até tocar em sua mão, indicando os lugares que sua fala diz: — Ali à frente é a Ilha do Araújo, com sua vila de pescadores, e a Baía da Ilha Grande. Aqui é onde fica o Alambique Maria Izabel e o alambique fica lá na encosta.

As instalações do sítio e do alambique que fica lá no alto da encosta são simples e bem cuidadas, transportando Helena ao passado. Há pouca distância um do outro, em jardins bem cuidados emoldurados pela mata e o mar, ficam a plantação, o sítio e o alambique

— Espetacular! - elogia Helena, entorpecida com o toque de Bruno que continua segurando sua mão. Ela se vira em direção ao rapaz com os lábios entreabertos encontrando Bruno a observando ternamente. Ela então fecha os olhos esperando o toque dos lábios do rapaz nos seus.

—Bruno, desse jeito terei que te contratar como meu funcionário.

Bruno e Helena se viram para direção de onde veio aquela voz tão calma e se depararam com uma mulher de cabelos longos grisalhos em uma generosa trança sentada na rede da varanda da casa , olhando para eles de forma serena.

— Maria Izabel. - Fala Bruno enquanto caminha em direção à mulher simples que agora se levanta de sua rede com os pés descalços.

— Bruno. - Fala Maria Izabel virando o rosto, permitindo que Bruno a cumprimentasse. — Como está?

—Estou ótimo. E a senhora?

—Estou bem, acabei de moer a cana. - Responde Maria sorrindo para o rapaz. Então ela se vira em direção a Helena que está um pouco mais afastada dos dois: — E ela é?

—Essa é a Helena, contratou nosso pacote de Bike tour. - Explica Bruno.

— Hummm... e desde quando meu sítio entrou na rota de vocês? - Pergunta Maria Izabel, surpresa com a explicação de Bruno. Apesar de seu alambique ser muito conhecido na região, o rapaz não trazia seus clientes para cá, até para evitar que eles saíssem bêbados por aí.

—Ela é especial. - Fala Bruno para Maria Izabel. — Só não diga isso a ela.

— Por que ela é especial?

— Você verá. - Responde Bruno enquanto gesticula para Helena se aproximar. Assim que a jovem se aproxima, ele continua dizendo: —Helena, essa é a Maria Izabel , a criadora e proprietária do melhor alambique da região e se bobear do mundo!

—Bruno, sempre tão exagerado. - Fala Maria Izabel sorrindo para Helena. — Prazer em conhecê-la.

—O prazer é todo meu. Seu lar é lindo. - Elogia Helena, admirada com tudo. — Parabéns!

— E ela construiu o alambique sozinha. - Continua Bruno falando. — Conta para ela, Tia Maria.

—Jura? Adoraria conhecer a sua história de perto. - Diz Helena encarando Maria Izabel que agora está com um semblante enigmático.

— Agora eu entendi. - Solta Maria Izabel analisando Helena com todo cuidado.

—Entendeu o quê? - Pergunta Helena, curiosa.

—Nada... - Responde Maria Izabel. Ela respira fundo e então fala mansamente. — Venham se sentar. Terei o maior prazer em contar a minha história.

Os três dão alguns passos até a varanda , onde Maria Izabel volta a se sentar em sua rede enquanto Bruno e Helena sentam no banco de madeira talhada. Ela sorri para os dois e então se ajeita melhor.

— Sabe, eu já tive esse olhar... Essa dor no olhar. - Comenta Maria apontando para Helena que se surpreende. — Divórcio? Término de namoro? Noivado?

—Ele terminou comigo poucas horas antes de entrarmos na igreja. - Responde Helena, tímida.

— Não só terminou, ele fez algo mais não foi? - Questiona Maria Izabel olhando para Helena como se enxergasse a alma da loira.

—Ele disse algumas coisas... E talvez ele estivesse certo a meu respeito. - Afirma Helena, triste. Ela então encara Maria Izabel e diz: — Bom, mas eu não vim aqui para encher a senhora sobre meu relacionamento que não deu certo. Agora eu quero saber como a senhora construiu esse paraíso?

—Bruno, peça para a Maia pegar a cachaça azuladinha e a ouro, por favor. - Fala Maria Izabel olhando serenamente para Helena. — Para conhecer minha história, precisa saborear o meu produto.

—Claro. - Fala Bruno caminhando para dentro do sítio.

—Helena. - Chama Maria Izabel atraindo novamente atenção da loira. — Saiba que somos muito mais parecidas do que pensa.

—Mesmo? A senhora também foi abandonada no altar? - Pergunta Helena, surpresa. Agora entendia o motivo pelo qual Bruno a trouxe até o alambique de Maria.

—Não. Eu me casei com dezessete anos. Tive seis filhas com ele e um relacionamento conturbado. Até que um dia nos separamos e eu investi todo dinheiro que tinha quando comprei esse sítio à beira mar. Tudo porque eu só queria um pedaço de terra para plantar e ter um cavalo que era um sonho de infância. Porém, eu comprei e me vi sem dinheiro ou profissão e, na época, com cinco filhas para criar, uma na barriga e fiz de tudo um pouco. Vendi bananas, bordei, costurei, fui jardineira e até marinheira. Eu levava turistas em passeios pelas ilhas de Paraty, no barco comprado para o meu próprio transporte. Não havia estradas para o sítio Santo Antônio naquele tempo, então em deslocava com o barco. E apesar de tudo o que eu tentava fazer, sempre ouvia uma frase do meu ex-marido na minha cabeça dizendo: Se não fosse por mim, você seria uma cachaceira! E quer saber, ele estava certo. A cachaça corria nas veias da minha família há anos e não podia mais negar isso. Então, plantei meu primeiro pé de cana aqui e comecei aos poucos. Peguei a frase dele e redefini meus padrões e quebrei os preconceitos a respeito da cachaça feita por mulher. Então, do dia que eu plantei meu primeiro pé de cana até hoje decidi quem eu era: Eu sou cachaceira sim! Sou sim.

— E das melhores. - Brinca Maia se aproximando com as duas garrafas pedidas pela mãe enquanto Bruno segurava os copos.

—Obrigada. - Agradece Maria Izabel dando um beijo na face da filha que se senta ao seu lado. — Eu terminei de montar o alambique grávida da Maia e a primeira destilação só aconteceu dela completar o segundo aniversário. Maia nasceu com Síndrome de Down, mas não a limitou em nada também. Ela é a minha maior companheira e o maior incentivo . Na verdade, as seis filhas sempre deram força para que seguisse em frente nos momentos mais difíceis. Porque não pense que é fácil, mas depende muito de você. - Finaliza servindo a cachaça transparente e entregando para Helena.

Helena segura seu copinho de cachaça, leva até seus lábios e então vira , saboreando a bebida servida. Ela pigarreia logo após a cachaça passar por sua garganta e percorrer o seu corpo, trazendo uma sensação de calor.

— Então, o que achou? - Pergunta Bruno encarando Helena, curioso.

—Forte , mas suave. - Tenta dizer Helena antes de tossir.

— Como deveriam ser as pessoas. - Comenta Maria Izabel encarando Helena.

—Como deveriam ser as pessoas. - Repete Helena balançando a cabeça em direção a Maria, concordando. Ela se vira para Bruno e continua. — Forte e suave.

— Agora está na hora de colocar um sorriso de verdade no rosto dessa jovem aqui. - Fala Maria Izabel abrindo a outra garrafa de agua ardente já com o líquido de coloração dourada. — Sabe, quando a gente toma uma cachaça, a gente fica alegre. Então com a cachaça certa, você ficará muito mais feliz. Com essa aqui, todas as pessoas ficam alegres. - Finaliza entregando mais um copo para Helena que vira rapidamente.

— Acho que ela tem razão. - Afirma Helena com o rosto avermelhado rindo.

Eles continuam animados degustando as outras cachaças produzidas por Maria Izabel, enquando e ela explica todo o processo produtivo artesanal e bate papo com eles, deixando Helena bem a vontade como há muito tempo não se sentia. Tanto que a hora passa e quando Helena se dá conta, o sol já se permitia sumir na linha do horizonte da praia.

— Muito obrigada. - Agradece Helena para Maia depois de fazer a transação financeira pelo celular das cachaças que decidiu levar como mimo para algumas pessoas em São Paulo.

Porém, as cachaças que consumiu no dia , teve a grata surpresa de terem sido pagas por Bruno que conversava com Maria Izabel perto das bicicletas.

— Mande um beijo para sua mãe, por mim. - Pede Maria Izabel ao rapaz.

—Pode deixar. - Fala Bruno tentando disfarçar a tristeza com deu sorriso.

— Como ela está? - Pergunta Maria Izabel.

— A senhora sabe, tem dias bons e dias ruins...

— Bruno, você sabe que tudo tem seu tempo e nada acontece por acaso. - Comenta Maria Izabel. — Apenas tenha gratidão por tudo.

—É difícil ter gratidão por uma doença que está levando minha mãe aos poucos.

— Mas agradeça pelo tempo que ainda tem com ela. Essas frações de lucidez... Agradeça por isso. - Pede Maria tocando no rosto do rapaz. — Assim como pelas pessoas que estão e as que estão entrando em sua vida. - Finaliza agora olhando em direção a Helena.

—Helena não está entrando na minha vida. Ela é apenas uma cliente que precisava de cuidado. - Afirma Bruno falando tão rápido quanto o seu nervosismo permitia.

—Ah, querido. Ela já entrou. - Afirma Maria Izabel olhando para Bruno que olhava para Helena, nervoso.

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