Capítulo 1 – Weenny: A Decisão
Em meio ao choro e ao turbilhão de pensamentos que me segue, mesmo eu tendo fugido da presença dele, não posso fugir do que Eros disse e da nova realidade. O que estava encoberto até ontem agora está revelado e eu sou obrigada a lidar com tudo isso, mas como farei?
Esse é o momento em que eu queria poder culpar meu coração por mais uma vez ter me lançado em uma louca aventura, que claramente eu iria falhar, mas o meu coração continua a sinalizar positivamente em relação ao caráter dele.
Eros não é um canalha como todos os que cruzaram o meu caminho e não me fará sofrer... Isso é o que diz meu coração insiste em dizer. Mas se essa é a verdade, por que estou me sentindo assim e com meus olhos úmidos de desespero e angústia?
Meus sentimentos estão tão dúbios agora, meu coração não encontra uma direção, jamais pensei que estaria diante de uma situação como essa, na verdade há algum tempo que perdi o controle dos meus sonhos porque eles resolveram caminhar para a realidade.
Não poderia imaginar que ainda existisse Príncipe e Império nos dias de hoje, como é possível que Eros seja indiano, moderno como é, bailarino, fluente no português como qualquer brasileiro, agora me recordo que eu nem lhe pedi nenhuma prova, seria isso tudo uma brincadeira infeliz?
E mais uma vez meu coração intervém dizendo que Eros é um homem e não um moleque como os que tive em minha vida. Ele jamais teria dito tudo isso pelo simples prazer de me ver sofrer.
Começo a tentar digerir tudo o que ouvi naquela breve conversa. A principio há entre nós a grande diferença em relação a condição financeira e isso sempre me incomodou, porque nunca me interessou estar com qualquer pessoa pelo o que ela pode me oferecer, sempre que eu me aproximo de alguém é por me sentir à vontade, por querer ajudar, por carinho ou amor. Agora existem muitas outras diferenças entre nós e são muito maiores do que a primeira.
É inacreditável como agora Eros é tão diferente de todos e de mim, só posso ver agora, depois da última conversa que tivemos.
Ora, o que eu estou pensando? Estou louca? Eros sempre foi incomum em todas as suas ações, sempre mais respeitoso, romântico, sensual, cortês e gentil, cansamos de repetir isso durante nossas conversas.
Lembro-me das meninas insistindo que Eros não é desse mundo... E ele realmente não é, pertence a um mundo que jamais poderemos conhecer.
Eu estou cada vez mais confusa, mergulhada nesses pensamentos que parecem me sufocar, as horas vão passando rapidamente.
Eros Myron POV:
Não estou orgulhoso de mim e muito menos sobre tudo o que menti para a única mulher que eu amei e amo. Weenny tem razão, omissão e mentira são a mesma coisa e produzem a mesma dor e destruição, eu li isso em seus olhos, segundos antes do nosso rompimento.
Eu tive que cumprir minha obrigação e satisfazer as exigências que me foram impostas, estou pagando com tudo o que me é caro e precioso de verdade.
Tive tanto tempo para me preparar para essa conversa com a Weenny, eu sabia que precisaria de coragem para esse momento, que certamente seria o mais penoso, a conversa mais difícil da minha vida, ter mentido para ela me fez descer ao nível de qualquer outro homem que a fez sofrer, e essa situação fez com que eu me sentisse o mais imprestável e miserável dos homens.
Fiz com que Weenny conhecesse todos os meus segredos, ela soube o meu nome, minha origem e meu destino, está ciente tudo o que há de ser conhecido ao meu respeito, estava pronto para lhe dar as provas e os detalhes que ela quisesse e se conseguisse aceitar.
Eu lutei contra meus pais, lutei contra a tradição do casamento arranjado, que é tão comum para a realeza e exigido por minha família, para ter meu sonho realizado. Sonhei em me casar por amor, mas omiti os meus segredos e isso nos causou uma dor tão intensa que fez com que os olhos da Weenny se fechassem para este fato, de tal forma que ela só pôde enxergar nossas diferenças.
Ela disse que eu menti para ela quando disse que era solteiro, mesmo com todas as minhas tentativas de explicar que esse suposto compromisso nunca se efetivou e nunca foi além das promessas entre os nossos pais, ainda assim Weenny não aceitou e fez questão de listar tudo o que pode ser motivo de preconceito ou de dificuldade para um casamento entre um hindu e uma brasileira, como se algum desses argumentos me importasse.
Weenny parece não ter ouvido que meu pai aceitou o nosso casamento, depois de tudo o que ousei fazer, obrigando-o a desfazer a aliança para o casamento arranjado entre o Império da Índia e o reino do Paquistão, unindo o Príncipe da Índia e a Princesa paquistanesa. Mesmo furioso e contrariado, meu pai acatou minha exigência de me casar por amor e não por interesses imperiais.
E depois disso tudo, ela ainda sugeriu que eu me casasse com a Princesa e mais uma vez eu pensei... Como eu poderia? Weenny é tudo o que eu sempre quis.
Minha angústia e desespero aumentaram e chegaram ao ápice quando a vi em tristeza profunda em seus olhos cheios de lágrimas, tentei tocá-la, mas ela não permitiu, simplesmente rompeu nosso compromisso e pediu que eu a esquecesse de uma vez. Weenny saiu correndo da suíte e fez questão de mostrar que não queria contato comigo quando lançou seu celular na cama.
Como posso tirá-la do meu coração se ela está tão firmemente presa com se tivesse sido costurada nele? Como poderia deixá-la se todos os meus caminhos me levam a ela?
Como doeu ter provocado essa dor na minha Weenny, omiti tudo o que é importante ao meu respeito e o fiz por imposição do meu pai, que também era a maior autoridade sobre todos os indianos e ninguém tinha o direito de contrariá-lo, sobretudo a família imperial, qualquer um que desobedecesse ou enfrentasse o Imperador podia ser condenado a morte, para tudo há um limite e eu já corri esse risco pelo meu casamento, esse segredo era de suma importância porque tratava-se da vida e da segurança dos Imperadores, do trono, do futuro dos súditos, do Império Rajput e minha como Príncipe.
Fui tomado por uma dor e tristeza que jamais havia sentido, meu corpo todo parece fraco assim como meu coração e a alma.
Me dei conta que estava na porta de entrada do hall, meus amigos insistiam em me chamar e eu não ouvia e não conseguia dizer nada até que a porta do elevador abriu. Andréa chegou e quis saber se eu autorizava a dar entrada nos proclamas do casamento.
Que hora perfeita para falar sobre isso.
Pare Andrea, não vai ter mais ca... Ela não quer mais se casar... – não sei quanto tempo depois, fui capaz de dizer.
Não consegui conter o choro, mesmo parando de falar, me encolhi tentando esconder ou abafar o choro e baixei a cabeça.
Não a vi mais, meus amigos me levantaram e me fizeram sentar em uma poltrona, queriam falar comigo para saber o que tinha acontecido e eu resumi dizendo que ela havia partido.
E agora o que será de mim sem o amor da minha vida? Perdi tudo... Se não sei mais viver sem ela, o que farei a partir de agora?
Eu me lanço ao chão, fico curvado para rezar para o deus da minha mãe e faço como ela ensinou, rezo para os deuses do meu pai implorando que tragam de volta a minha amada. Fico ajoelhado por muito tempo e várias vezes faço todas as orações que sempre vi meus pais fazendo, tento falar as orações em voz baixa.
Recebo o apoio e carinho dos meus amigos, mas não consigo erguer a cabeça ou olhar para eles, só sinto que não me deixam sozinho em nenhum momento.
As horas vão se passando e ela não volta, o dia está se passando e a noite já é densa, mas ainda não há nenhuma notícia da Weenny, ninguém a viu, ela não liga e eu permaneço imóvel esperando que ela retorne para sua suíte, não há outra solução.
Weenny Alves POV:
Senti um vento frio, mas o agasalho não me fez falta. Olhei para as minhas duas alianças nos dedos anelares e senti que a alegria do noivado se desmanchou nessa dor e confusão de hoje. De que forma daria certo um casamento com o Eros novo? Eu só conhecia o antigo e achava que conhecia bem.
Como eu podia aceitar e como seria capaz de ser esposa do Príncipe? Ele poderia viver no Brasil ou seria obrigado a viver na Índia? Como eu poderia olhar para os pais dele?
Jamais imaginei que Príncipe, Princesa, Imperador e Imperatriz pudessem viver fora dos contos de fadas.
Lembrei que antes de sair da minha suíte eu terminei nosso relacionamento, me arrependi de tomar a decisão no calor da emoção, afinal eu sou apaixonada pelo Eros, o meu Eros, mas a condição atual me deixou confusa e temerosa, seja como for, eu decidi meu futuro e devo arcar com as consequências das minhas palavras e das decisões intempestivas.
Caminhei pelo calçadão por muito tempo, quando cansei, voltei a sentar sobre a areia da praia e continuei refletindo a respeito de tudo.
Já havia escurecido, seria melhor retornar para casa antes que as ruas ficassem ainda mais desertas, olhei no relógio público e vi que já havia passado da meia noite, mal pude acreditar que passei o dia todo fora de casa.
Por sorte os taxis circulam por toda a noite e madrugada no Rio de Janeiro, sinalizo para um e ele para para atender ao meu chamado. Retorno para o hotel, triste, desanimada e dolorida, ando sem pressa pelo saguão e entro sozinha no elevador.
Abro a porta da suíte e percebo que todas as luzes estão acesas, em seguida vejo os colchões espalhados pelo chão e todos os meus amigos sentados sobre eles, todos bem acordados e com expressões de preocupação.
Ao perceber a minha presença, Eros vai levantando-se, dou alguns passos na sua direção. Seus olhos são espelhos para os meus, refletem nossa dor intensa e cansaço.
Uma curta distância nos separa, olhamos fixamente um para o outro e em silêncio por alguns segundos, sinto que preciso de coragem para continuar a olhá-lo, baixo a cabeça.
O silêncio é total também entre os amigos, ouço uma música triste de amor no ambiente.
— Olhe para mim Weenny, o que vê? – Eros de repente diz.
— Agora eu só vejo o Príncipe e não consigo ver o homem que era meu noivo. - levanto a cabeça, olho para ele, mas não verbalizo a minha resposta, sei que ele entenderá o que digo com meus olhos.
— Sou apenas um homem que encontrou a mulher da sua vida e que implora para ela aceitá-lo como ele é. - então ele diz.
Meus olhos se enchem de lágrimas e algumas teimam em escapar, mesmo eu tentando segurá-las.
— Como isso pode ser? Você não deve e não precisa implorar, você é só o melhor sonho da minha vida... E eu hei de guardar cada detalhe em minha memória. – digo.
Tento desviar o olhar para fugir da minha dor, Eros percebe o meu movimento e toca na minha mão direita para chamar a minha atenção.
— Tomei uma decisão. Vou renunciar a tudo para poder ficar com você, se isso te persuadir a voltar a mim. Comunicarei a minha decisão ainda hoje e agora! – ele diz e pega o celular do bolso.
— Você não pode fazer isso! Este é o seu destino. - me aproximo, tiro o aparelho de suas mãos e digo.
—Eu posso fazer e é a minha única escolha. Você cortou nossos laços usando meu destino como motivo, meu fardo não me impedirá de viver o nosso amor. – ele diz com firmeza.
— Er... - não consigo pronunciar o nome dele, agora que sei que não é o nome verdadeiro.
— Quando eu te toquei pela primeira vez, os meus momentos de solidão acabaram, minha vida vestiu um novo sorriso e eu não sei por que Deus mostrou tanta compaixão por mim, de repente os meus desejos começaram a se tornar reais quando você me permitiu amá-la. Você não vê que não podemos renunciar ao nosso amor? Como podemos nos separar ou nos distanciar de tudo o que vivemos juntos? Todas as lembranças boas que tenho estão fortemente ligadas e entrelaçadas a você, se você partir levará tudo o que tenho... Inclusive o meu coração. – o Príncipe diz.
— O que você diz está certo, mas... – eu tento dizer, mas sou interrompida.
— Você não percebe que todos os meus caminhos me levam a você? Não te dei apenas o meu corpo, dei a você o meu coração, você é a luz da minha vida. Hei de desistir do meu destino porque meu futuro é você, farei tudo o que for preciso por você. – ele insiste.
— Você não pode fazer isso! É uma insanidade! – digo, verdadeiramente preocupada com sua decisão.
— O que eu não posso é viver sem você! – ele afirma com veemência e mais uma vez me emociono.
— Quem tem poder sobre o amor? – respondo em voz baixa.
— Te suplico que me tire dessa agonia e não me deixe perdê-la. – ele pede.
— Seu nome é a música que está na minha respiração, é a melodia do meu coração. E isso tudo é sobre o amor e apenas o amor. Só você pode ouvir o meu coração, venha ouvir o quanto ele clama por você. – digo.
Eros corre na minha direção e me beija com tanta paixão e saudade que me deixa tonta. Me pega no colo e me leva para dentro do quarto, me amando com uma sede voluptuosa por muitas horas. Cansamos, mas quase não dormimos, cochilamos quando os primeiros sinais do amanhecer surgem, durmo nos braços do meu Príncipe.
Abro os olhos e noto que Eros está me observando.
— Bom dia Rajkumari!*
— Bom dia, meu amor. Ainda me causa estranheza saber que tenho um novo homem em minha cama, me sinto especial por dormir com um Príncipe.
— Para você eu sou o mesmo homem. Agora você pode me chamar como quiser, Jagadeesh, Jagal ou Eros, um para cada momento que você desejar. – ele explica.
— Como me portarei diante dos Imperadores? Quem tem sogros Imperadores? – pergunto e recebo um carinho e um sorriso esperançoso.
— Apenas você, a futura Imperatriz de Hindustan, esse é seu destino, nosso destino e nosso trono! - responde sério.
Eu abraço meu noivo sentindo medo dessa nova vida.
— Não se preocupe com mais nada, vamos cumprir o nosso destino. Eu sempre a chamei de Princesa, mas agora isso se tornará real porque logo uma coroa virá enfeitar a sua cabeça, sei que você sabe se portar e isso deixou meus pais encantados por você. Resolverei tudo isso o mais breve possível, te garanto. Só peço que confie em mim!
— Lhe confiei a minha vida quando você colocou essas alianças em meus dedos e pescoço. – digo enquanto mostro os anéis nas minhas mãos.
— Me perdoa? Eu nunca quis omitir nada de você. – ele pede, sinceramente.
— Te perdoo, mas não quero que haja segredos entre nós daqui para frente. – peço e o vejo concordar.
— Você tem a minha promessa. Agora sou eu que tenho um pedido para fazer.
Sorrio e faço um gesto para pedir que ele prossiga.
— Vamos levantar-nos daqui e correr com os preparativos do nosso casamento? Não suporto mais esperar, e também não quero correr risco de você resolver me abandonar de novo. – ele pede e eu gargalho de sua tolice.
— Está bem. Como será?
— Terá que ser na Índia. No Império, ao lado dos meus pais, dos seus pais e de nossos amigos, tudo conforme a tradição hindu, como sonhamos, só que agora um pouco maior, mais rico e elegante... – ele para um momento e observa a minha expressão —...Ok, você sabe, não vou mentir, será um casamento milionário e como jamais se viu, meus pais fazem questão de que seja grandioso, logo depois seremos considerados Rei e Rainha.
Ok, agora estou apavorada. Será que fiz bem em aceitar esse casamento?
— Meu Deus! Espero que a coragem não me falte e que eu não os envergonhe. Por favor consiga algum professor ou Guru que me ensine tudo o que preciso aprender até o casamento. E por falar nisso, quando será marcado o casamento? – digo, receosa.
— Já que é seu desejo, eu contratarei hoje mesmo um Guru que há de lhe ensinar tudo o que é necessário e tudo o que a minha Princesa desejar. Quanto ao shádi, é assim que meu povo diz a palavra casamento, tudo deve ser preparado pelos Imperadores, então terei que ir para a Índia para me certificar de que as escolhas deles também a agradarão, ficaremos afastados por muitos dias e esse será o preço por se casar com um Príncipe. Saiba que você será tratada como uma Princesa, por ser noiva do Príncipe sucessor do trono. Veremos uma data que nos traga sorte, uma data auspiciosa, para realizar todo o cerimonial, espero que aconteça em no máximo em três meses.
Estou realmente surpresa e assustada com essas informações, Eros ri e me dá um beijo.
— Tão depressa?! Deus me ajude a acostumar com tantas novidades. Eu aprenderei tudo o que eu puder porque quero ser uma boa esposa, mas não vou pensar no trono, não agora para não perder a coragem. – digo e o vejo concordar.
— Eu serei a tua coragem, assim como você é a minha, nossos destinos caminham juntos e um dia teremos a prova disso. Meu amor, não podemos contar a mais ninguém sobre meu segredo, agora nosso segredo, principalmente para nossos amigos, para eles diremos apenas que vamos realizar nosso sonho de um casamento hindu, eles não devem saber que será no Forte Agra, local onde mora seus sogros, os Imperadores. – ele pede.
É mesmo, nossos amigos devem estar curiosos para saber sobre nossa briga, que péssimos amigos nós somos, estávamos tão transtornados que esquecemos deles.
— Vai ser ruim esconder esse segredo deles, mas se prefere assim... Escute, nós esquecemos dos nossos amigos e simplesmente saímos de perto sem dar qualquer explicação.
— Poxa, é verdade. Eu estava transtornado. Vamos nos desculpar com eles imediatamente.
Tomamos banho, nos arrumamos e seguimos para a sala de estar.