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Não dura

No fim de tarde, enquanto arrumava o que levaria, Paulina se perguntava se havia tomado à decisão certa. Seu pai dissera que sim; Mirela e seu marido, Fabrício, pareciam tranquilos com a possibilidade do filho ter alguém “ajuizada” por perto; até sua irmã, Paola, suspirou ao imaginar a convivência com Simon.

— Você arrumando a cama dele, de repente ele aparece só de toalha e...

Balançou a cabeça diante das lembranças do que a mais nova dissera que conseguia fazer com que suas bochechas ficassem quentes. Nunca imaginara que Paola, cinco anos mais nova, pudesse ter pensamentos tão... Nem conseguia descrever.

— Pronta, Lina?

— Sim, dona Mirela — respondeu fechando a pequena valise.

Mirela olhou para a valise e franziu a testa.

— Só isso?

— Sim... — gaguejou constrangida. Decidira levar poucas roupas, era possível que pedisse demissão naquele dia.

Sem dizer nada, Mirela a levou até o carro onde Paulo aguardava para levá-las ao prédio em que o Salvatore morava, cerca de uma hora da mansão. Mesmo assim o caminho foi rápido, até demais em sua opinião.

— Pode se despedir do seu pai, Lina. É provável que só o veja nos fins de semana.

Paulina abraçou seu pai, que se surpreendeu com a atitude. Desde que a esposa falecera, talvez até antes, não demonstrava carinho por nenhuma das filhas e nem esperava tal atitude delas. Isso o preocupou, principalmente em perceber que Paulina se segurava para não chorar. Podia ler nos olhos dela que queria desistir, o que jamais permitiria. Apesar de não gostar da ideia de sua filha próxima do caçula dos Salvatore – devido à fama de conquistador de Simon -, confiava no discernimento e profissionalismo da filha, fruto da educação exemplar e rígida que transmitira.

— Sei que irá honrar o sobrenome Perez. — Aquilo era tudo que precisava dizer para que Paulina não cometesse qualquer desatino.

Paulina encarou Paulo em choque. Conseguia ler nas entrelinhas que se não passasse o ano todo como governanta de Simon seria para sempre sinônimo de fracassada para seu pai. A decisão que tomara não tinha volta, era isso que lia nos olhos dele.

— Não o desapontarei... — murmurou insegura, afastando-se de cabeça baixa, a franja espessa cobrindo sua fronte e evitando que seu pai visse seus olhos marejarem.

Como um robô encaminhou-se para o lado de Mirela e a seguiu rumo ao apartamento de Simon. Mentalmente repetia como um mantra: “Papai, Paola, Fabrício e Mirela acreditam que conseguirei, então conseguirei”.

~*~

Ele merecia o troféu idiota do ano. Porque diabo confiara uma responsabilidade enorme a sua mãe? Deveria ter pensado um milhão de vezes antes de abrir a boca e pedir a ajuda dela. Não, deveria ter pensado um trilhão de vezes ou mais. Se soubesse quem seria a contratada teria ficado com uma das ninfomaníacas que entrevistara.

— Mãe, diz que estou enganado.

— Sobre o que, querido? — quis saber Mirela segurando a vontade de rir da expressão do filho.

— O que acha?

Com o olhar enviesado para a jovem de cabeça baixa no centro da sala, se condenou por deixar Mirela contratar quem quisesse sem ver antes de quem se tratava.

— Deveria ter incluído que devia ser uma pessoa menos... Paulina — queixou-se como se a jovem fosse um padrão a ser evitado.

— Mas qual é o problema? Ela atende todas as suas requisições — retrucou Mirela, recordando em seguida tudo o que o filho pedira. — Discreta, organizada, confiável e garanto que não tentará te seduzir. Mais fácil o contrário... — insinuou, causando um forte rubor na face da Perez e um olhar enviesado do filho.

Simon concordava em parte com Mirela. A Perez tinha todas as qualidades que pontuara e certamente não tentaria seduzi-lo — tampouco ele a assediaria. Mas, levando em conta sua vida desregrada, não pôde deixar de anunciar o inevitável:

— Não dura uma semana.

— Querido, acredite, ela vai durar. — Mirela envolveu os ombros da Perez com um braço. — Paulina é tudo o que você precisa.

— No momento preciso de um whisky bem forte — resmungou fitando a criatura corada que encarava tudo menos ele. — Tem um escondido com você, Perez?

— Nã-não... — ela respondeu olhando para o chão.

— Imaginei — declarou fitando as mãos pequenas e brancas, cujas dobras dos dedos se encontravam vermelhas, com certeza estava nervosa e apertava a alça com força demais. Sorriu de lado disposto a colocar mais tensão na jovem. — Moças como ela não bebem, não fodem e não fazem nada do que considero normal.

— Simon Salvatore! Tenha modos — repreendeu Mirela sentindo o leve tremor da Perez. Sabia que o filho tentava assustar Paulina, queria que a jovem desistisse, mas não permitiria isso.

Paulina desejava sair correndo. Era evidente que em nenhum momento Simon a aceitara como governanta. Não sabia por que, mas Mirela mentira para convencê-la. O que de mal fizera à matriarca Salvatore para merecer tamanho castigo?

— Se ela vai morar aqui é melhor se acostumar com os meus modos. Não sou como o palerma do Muller, cheio de floreios.

— Dona Mirela, é melhor rasgar o contrato. — praticamente implorou a morena, os olhos marejados pelo esforço em conter a vontade de estapear o Salvatore. — É evidente que o senhor Simon prefere outra pessoa.

— Demorou a notar — Simon retrucou. — De preferência alguém que, pelo menos, olhe na minha cara quando estiver na minha presença — disse ultrajado. — De todas as empregadas da mansão, tinha que ter escolhido justo ela?

— Sabe muito bem que Paulina nunca foi empregada da mansão. É como se fosse uma filha — declarou Mirela olhando para Paulina com um sorriso antes de se voltar para o filho com a expressão fechada. — Qual o seu problema, Simon? Por que trata tão mal a Lina? Quando eram crianças...

— Não importa o que aconteceu ou deixou de acontecer na minha infância no que se refere à Perez. Eu não quero dividir o teto com ela — comunicou categórico.

— Durante um ano assim será. Está tudo assinado e registrado, e caso quebre o contrato terá que pagar uma multa de quinhentos mil à Paulina. Aconselho que a respeite.

— O quê? — perguntaram ao mesmo tempo Simon e Paulina, encarando surpresos a Salvatore que sorria satisfeita.

— Dona Mirela... Você disse que se eu desistisse não haveria multa...

— Oh, querida, a multa não se aplica a você — interrompeu Mirela com um sorriso propositalmente doce. — A multa é uma garantia de que Simon não fará nada para que se demita durante esse ano. É lógico que se você se demitir é culpa dele, então Simon terá de pagar.

— Isso é sério? — Simon encarou Paulina com um olhar glacial, embora a Perez continuasse com os olhos fixos em Mirela. — Caso se demita, pago pelo luxo de me ver livre da santa sem altar?

— Exato — respondeu Mirela ainda sorrindo.

— Isso é loucura.

— Encare da forma que preferir filho. — Com ar displicente olhou o relógio. — Está tarde, vou embora e deixarei vocês mais à vontade.

Sem esperar uma nova onda de reclamações do filho, Mirela saiu praticamente correndo do apartamento, deixando Paulina e Simon sozinhos, um clima tenso e silencioso no ar.

— Satisfeita, Perez?

— E-eu... Eu não imaginava... — começou Paulina olhando para as próprias mãos.

— O que você não imaginava? — Simon se aproximou dela, que deu alguns passos para trás até sentir a parede às suas costas. — Que eu nunca escolheria você como minha governanta ou que receberá muito dinheiro em questão de dias? — Segurou o queixo da Perez e o ergueu, obrigando-a a olhá-lo de frente. — Se acha que mudarei meu modo de ser só porque você e minha mãe armaram pra cima de mim está completamente enganada.

— Mirela também me enganou — defendeu-se desejando que Simon largasse seu rosto, mas sem coragem de pedir ou se afastar. Aquela aproximação lhe dava certo medo, Simon era pelo menos vinte centímetro maior, mais forte e parecia muito zangado.

Simon riu. Imaginava que isso ocorrera. Só não conseguia compreender porque Mirela escolhera a Perez. Havia algo oculto nos planos de sua mãe e não conseguia adivinhar o que era.

Fixou os olhos negros nos âmbar da Perez, que imediatamente desviaram para outra direção. Normalmente as mulheres o encaravam com desejo, luxúria, curiosidade, mas Paulina sempre evitava olhá-lo e ele odiava quando fazia isso.

— Por quê? — murmurou deslizando a mão do queixo para a nuca da Perez.

— Eu não sei — Paulina respondeu levantando o olhar para encará-lo e demonstrar que era sincera em suas palavras. Porém, incomodada com a forma que era observada, desviou o olhar, vacilando ao declarar. — Ju-juro que nã-não sabia da multa... só queria um tra-trabalho...

Por que ele continuava tão próximo, minando qualquer pensamento coerente que pudesse ter? Perguntava-se Paulina sentindo a respiração de Simon se misturar com a sua. A mão pousada em sua nuca fazia um arrepio esquisito subir por sua espinha. E o cheiro agradável que se desprendia dele a envolvia de uma forma inconveniente, despertando aquele desejo insano de inspirar fundo.

Arregalou os olhos quando ele se inclinou em sua direção, os lábios se aproximando dos seus, faltava pouco para se tocarem quando Simon moveu o rosto para o lado e disse em seu ouvido.

— Já que teremos de conviver, devo avisá-la que sigo certas regras em relação às mulheres que entram nesse apartamento.

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