Você, hospedada na minha casa tem causado comentários entre os empregados
Aos poucos a luminosidade do quarto vai entrando em meus olhos conforme vou acordando. O cheiro suave do perfume de Raed está no quarto, isso é o suficiente para me deixar mais desperta. Por fim me sento na cama o procurando com os olhos. Logo o avisto. Ele está em frente a sacada, olhando para fora. Está usando um de seus ternos caros, um cinza chumbo, impecável.
Limpo a garganta. Ele se vira para mim. Não consigo deixar de reparar como seus cabelos estão devidamente penteados para trás. E como a camisa cinza mais claro combina com seu terno e sua gravata preta com tons cinza.
—Sabah alkhayr. (Bom dia) —Digo.
—Sabah alkhayr.
Ele faz menção de se aproximar e isso é o suficiente para que eu quase me encolhesse na cama.
—Não precisa me olhar assim, eu só vou conversar com você.
Eu solto o ar.
—Tudo bem.
Quando ele se senta na minha cama, fico mais inebriada com seu cheiro maravilhoso. O encaro séria.
—Podemos esquecer por alguns minutos que você nos odeia?
Eu não o odeio, mas não digo nada, apenas assinto.
—Ficarei fora quinze dias, vou precisar viajar à trabalho.
—Entendo.
Ele sorri sem humor.
—Vai se ver livre da minha presença.
Eu não respondo por um momento, só fico olhando para ele.
—Boa viagem. —Digo, por fim.
—E tem outra questão, mais delicada. —Ele diz suavemente, com muito cuidado.
Isso me deixa nervosa, pois não gosto desse delicado que ele falou.
—Mais? —Pergunto ironicamente.
—Quando eu voltar, logo nos casaremos. —Ele diz, passando por cima da minha ironia.
Sinto uma calma estranha quando ele diz isso. Talvez eu já esteja entorpecida com tanta coisa acontecendo e já não me espanto com mais nada. De repente percebo que fico um tempo demasiado sem falas.
—Não vai me perguntar por que resolvi antecipar nosso casamento?
—Por quê? —Pergunto num fio de voz.
—Você, hospedada na minha casa tem causado comentários entre os empregados. Toda hora ouço uma coisa aqui e outra ali. Eu fiz uma reunião com todos agora e já repreendi essas fofocas aqui dentro do palácio. Mas sei que é por pouco tempo. Então, precisamos resolver sua situação logo. Afinal, você será minha esposa e não quero que saia daqui nenhum comentário maldoso a seu respeito.
Quando as falas dele terminam eu já estou sem ar, e sem ação. Pode não parecer, mas nunca agi por impulso, sempre pesei bem minhas ações. Sou equilibrada, centrada e só me envolvi mais com Zein pois ele me fez acreditar que tudo ficaria bem entre nós. Eu acreditei realmente que ele me levaria à sério. E jamais pensei que numa única transa, eu ficaria grávida. E mais...que ele morresse e mais...que ele era um fraco e nunca me assumiria.
—Tudo bem. Vocês já puxaram mesmo as cordinhas da manipulação. Estão no controle... O que posso dizer?
Raed contrai os lábios.
—Bem, é isso.
Ele então retira do bolso um celular e me entrega.
—Para nos falarmos, meu número está aí. Qualquer coisa me liga, não importa o dia e a hora.
—Está certo.
Ele me olha então sem jeito.
—Perdoe-me por ontem. Eu não sei o que deu em mim. Sei que ainda sofre pelo meu irmão.
Allah! Se ele soubesse que me sinto culpada por não sofrer por ele e ao mesmo tempo acho que estou certa depois de tudo que descobri dele...
—Tudo bem.
—Está certo, tudo bem. É só isso que sabe dizer?
Eu passo a mão nos olhos já cansada.
—É tudo. Você está acostumado com seus casos descompromissados, sai com suas mulheres e depois as esquece. Então para você, esse casamento é algo do tipo. Mas eu não! Acho que o casamento é algo sério e o sentimento "amor" deve imperar nele.
Raed ofega e diz seco:
—Na nossa cultura nos casamos por muito menos que isso, e os casamentos duram. Aqui os casos de divórcio são baixíssimos.
Eu respiro fundo.
Como vou fazê-lo entender? Como mudar a cabeça desse homem?
Esquece!
—Tudo bem vossa excelência, vou encarar o inevitável com otimismo.
Raed se levanta e sem dizer mais nada, sai do meu quarto.