Família
O dia amanheceu e as notícias não foram muito boas, o delegado ligou informando que o grupo de caçadores mortos, era um pequeno contingente de uma grande equipe que se dividia para explorar áreas de reserva. Se consideravam acima das leis de proteção ambiental e tinham costas quentes no meio político.
O delegado Arlon, em uma tentativa de chamar a atenção das autoridades (in)competentes, chamou equipes de mídia e contou o que estava acontecendo com os animais da reserva. Estavam noticiando direto na Tv e na internet e o receio agora era com os desavisados que adoram ver para crer.
Zoren estava mais preocupado com Ava, sua companheira vivia sozinha no alto da Floresta dos Pinheiros, em uma cabaninha e sozinha. Mesmo sendo uma loba e caçadora, ainda era uma fêmea sozinha.
Depois de verificar as contas da Alcateia e a organização dos mantimentos, foi a casa dos pais de Ava e Demétrio.
Zoren tinha certeza de que Ava era a filha desaparecida deles, teria que contar-lhes sobre ela, tentar descobrir o máximo de informações sobre o ocorrido e levá-los lá para vê-la. Precisava solucionar o mistério do desaparecimento dela, pois pela reação dela quando conversaram, suas lembranças eram muito ruins e provocaram trauma.
Ele estava com 16 anos na época e fez parte das buscas. Lembrava-se muito bem das noites de frio intenso que passavam, correndo na neve entre os pinheiros, procurando qualquer sinal que fosse, da pequena. O mais incrível é o fato de, agora, ela estar ali tão perto deles.
Chegando a casa dos Begay, bateu a porta e esperou, logo a porta foi aberta por uma sorridente fêmea, que depois de cumprimenta-lo, o convidou a entrar.
-Bom dia Shirley, gostaria de falar com todos presentes, pode ser? - Zoren perguntou.
-Claro Alfa, eles já estão descendo, sente-se que vou buscar um café. - Enquanto ela ia até a cozinha, pai e filho chegaram à sala.
-Bom dia Alfa, estavamos vendo o noticiário sobre os caçadores e patece que o Greenpeace está vindo para cá, o senhor viu isso? - Perguntou Begay.
-Pare de me chamar de senhor, homem. Fico me sentindo um ancião. Eu soube das notícias pelo Arlon, mas apesar de precisar tomar algumas providências, preciso lhes falar sobre outro assunto - Shirley chegou com o café e todos nos servimos.
-Em que podemos lhe ajudar alfa? - Perguntou Demétrio.
-Primeiro, eu gostaria que me contassem, principalmente você Demétrio, o que aconteceu exatamente no dia do sumiço da filha e irmã de vocês - foi direto.
Eles olharam espantados para o Alfa e depois se entreolharam e Begay perguntou:
-Mas porque isso agora, Alfa?
-Contem, por favor - zoren foi incisivo.
-O inverno estava rigoroso aquele ano, mas houve um dia que amanheceu com o céu limpo e azul. A neve estava firme e as todas as crianças correram para descer a montanha em suas pranchas ou pequenos trenós, inclusive Aveline. Passaram o dia brincando, mas logo o tempo virou e todas voltaram, Demétrio estava cuidando dela, então não me preocupei - narrou Sheila, a mãe.
-Então você não estava com ela? Onde estava? - Perguntou Zoren.
-Eu estava arrumando a casa e cozinhando. Mas quando percebi a mudança de tempo, fui até a porta para mandar que as crianças entrassem, Demétrio estava com dez anos e Aveline com 6. Vi Demétrio brincando e perguntei pela irmã e ele disse que ela já tinha vindo, que devia ter entrado. Mas olhei em vasa e ela não estava. - Estavam todos emocionados e Demétrio começou a chorar.
-Foi aí que você sentiu falta dela e iniciou a procura? - perguntou o Alfa novamente.
-Não imediatamente, como disse, estava cozinhando, então primeiro olhei a comida e depois fui chamá-la para comer e então não a encontrei, saí de casa nervosa, falei com Demétrio, perguntei onde ele deixou ela e ele disse que eles estavam escorregando na neve e vieram embora. Mas ela não estava em lugar algum, a minha menininha - Begai a abraçou, tentando confortá-la, mas as lágrimas corriam pelo seu rosto.
-A culpa foi minha, Alfa. Eu fui culpado pelo sumiço da minha irmã - falou Demétrio desesperado.
-Calma meu filho, não se culpe, você só tinha dez anos, também era uma criança - consolou Begay, ao seu filho.
-Não! Vocês não entendem? Eu abandonei minha irmã sozinha na neve - abaixou a cabeça, chorando desesperado.
Nesse instante, Sheila levantou o rosto molhado, do peito do marido, para olhar para aquele homenzarrão chorando desesperado.
-O que foi que disse meu filho, você abandonou a sua irmã sozinha na neve? Como? Você disse que ela voltou com você. Conta isso direito, por favor, filho. - pediu sua mãe.
Demétrio limpou o rosto na manga da camisa e começou a contar o que realmente aconteceu:
-Naquele dia fomos todos brincar, como mamãe contou, mas quando o tempo virou, todos vieram embora, então chamei Avenise e ela pediu para descer só mais uma vez e eu disse não, me virei e saí andando, achei que ela estava vindo atras de mim. Quando cheguei perto de casa, me distrai com os meninos jogando bola e não vi que ela não estava lá. - baixou a cabeça desesperado, parecia desabafar tudo que guardou por todos aqueles anos.
Sheila se agarrou no companheiro e chorou mais ainda, chorou pelos dois filhos e por sua família quebrada.
-Sei que isso tudo foi terrível, mas preciso que se acalmem e me escutem com atenção, por favor. - Aos poucos eles foram se acalmando, Sheila e Demétrio se retiraram para lavar o rosto e voltaram para a sala.
-Estão todos bem, podemos continuar? - Todos balançaram a cabeça concordando.
-Todos vocês acompanharam o problema com os caçadores, Demétrio participou da perseguição a eles e os encontraram mortos. Trouxeram o despojo que encontraram no acampamento e … - Demétrio interrompeu.
-É isso, o cheiro da fêmea, era o cheiro da minha irmã - falou num salto - eu reconheci o cheiro, mas não sabia de quem era e agora, com todas essas lembranças, eu reconheci o cheiro, eta ela, ela esteve lá.
-Continuando: ontem eu peguei parte do despojo e fui levar para o Uchôa, pois a Blanca estava para dar a luz. Se aquiete Demétrio e escute - o jovem não parava no lugar - cheguei lá na hora para ajudar Blanca a dar a luz e quando a ultima filhote nasceu, uma fêmea entrou pela porta e reconheci minha companheira.
-Sua companheira, mas o que tem isso a ver com a minha irmã? - Demétrio, nervoso, andava de um lado para o outro, parecendo que ia pegar alguém.
-Aí é que está, ela praticamente rejeitou e quando viu o que eu tinha levado, pensou que era eu no acampamento, então descobri que foi ela que matou os caçadores. Entendeu agora, Demetrio? Vocês compreenderam, que minha companheira pode ser a filha de vocês?
Todos ficaram estáticos, tampando a boca aberta com as mãos. Demétrio caiu sentado de volta ao sofá, e o casal se abraçou, sem saber o que dizer.
-Tem mais - eles se voltaram para mim - ela mora em uma cabana miserável, lá no alto da montanha, na Floresta dos Pinheiros, seu nome é Ava e não aceita família, companheiro, nem Alcateia. Parece que seus únicos amigos são Uchôa e Blanca. Por isso quero que subam lá comigo para vê-la - terminou de falar e esperou eles concordarem, para irem lá buscá-la, porque ele não permitiria que ela ficasse nem mais um dia lá em cima sozinha.