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capítulo 7

Giulia

Minha consciência repetia essa pergunta veementemente: "O que está fazendo, Giulia?". E eu não sabia como responder tão fácil.

A única vez que achei estar certa foi naquele dia em que me vesti como uma vadia e pedi a ajuda dele. Só que eu não parava de pensar se essa foi a coisa certa a se fazer. Passei o dia andando de um lugar para o outro, tentando imaginar o que faria, como sairia dessa e como ficaríamos longe da cidade.

Dante era um homem misterioso. O que era um charme lá no início, mas, no momento, era uma tortura. Deixar tudo em suas mãos não era nada legal. Ele fazia o que bem entendia, o que era bom para si mesmo, enquanto eu ficava naquela casa que mais parecia uma prisão particular, com uma garotinha minúscula nos braços, sem saber o que aconteceria com nossas vidas.

A mulher que ele trouxe até que era simpática, mas me limitei a uma conversa superficial com ela e a me isolar em algum lugar da casa. Eu sabia que ali, eu não precisaria ficar sempre alerta em relação à nossa segurança, então, em vez de pensar em fugir, eu apenas temia a presença de Dante.

A tarde veio depois de um dia chato no qual fiquei brincando e cuidando de Nina. Assim que o céu começou a escurecer, ela caiu no sono. Eu sabia bem como funcionava esse seu cochilo: com certeza ela acordaria no meio da madrugada, toda elétrica, impedindo-me de dormir tranquilamente. Já tinha até me acostumado com tudo isso, visto que passava a maior parte da noite acordada, com medo de ser encontrada e morta pelo homem que deveria me proteger de tudo.

Vendo que minha filha dormia como um anjo na cama, pensei em tomar um banho e, talvez, poder relaxar um pouco. Apesar de ela estar em um berço, protegida, eu tinha um certo medo de deixá-la por um segundo sequer naquele lugar. Aquela não era a nossa casa. Nunca havíamos tido uma, na verdade.

A pessoa que confiava em Deus e no mundo tomou um choque de realidade e começou a ver as coisas como elas eram. Portanto, eu sabia bem que não dava para confiar em mais ninguém, nem mesmo naqueles que achamos que nos amará no bom ou no mau momento.

Pouco tempo depois de ligar o chuveiro e começar a me ensaboar, ouvi o choramingo de Nina.

— Merda! — murmurei. — A mamãe já vai, querida. Só mais um instante.

Não era que eu não a deixasse chorar quando estava ocupada, porém me sentia mais segura estando a todo momento ao seu lado, já que ali não tinha ninguém de minha confiança a olhando. Tentei ser a mais rápida possível, até não ouvir mais nada. Acredito que isso era o que mais me deixava em pânico. Nina era uma bebê calma, que sempre estava sorrindo e brincando, mas era bem chorona às vezes. O cessar do seu choro me deixou assustada, já imaginando que algo ruim tinha acontecido para isso.

Estiquei-me para pegar a toalha, enrolei-a no meu corpo e saí o mais breve possível do banheiro. A primeira coisa que notei foi a sua ausência no berço. Depois, mais do que surpreendente, vi ela nos braços de Dante, que estava na varanda.

Senti o frio na barriga e quase uma falta de ar ao observar essa cena, pois até então o homem mal tinha olhado para a filha sem que tivesse que fugir depois.

— Fico feliz por parecer tanto com a sua mãe. — Eu o ouvi dizer para ela. — Quanto menos tiver de semelhança comigo, melhor para você.

Uma parte de mim queria ir até eles e a arrancar de seus braços. Eu sentia que não era necessário ele forçar uma interação entre pai e filha. Porém, passei mais um tempo assistindo ao que acontecia. Dante parecia saber como agir com uma criança, afinal de contas, tinha sobrinhos. Entretanto, desde que lhe falei sobre nossa filha ou estivemos juntas na sua presença, esse cara frio ainda não havia demonstrado o mínimo de felicidade que me parecesse que ele poderia criar afeto por ela.

Bem... Sendo um idiota ou não, ele era o seu pai e não lhe representava uma ameaça, ou não estaria nos ajudando. Decidi não correr até lá e ser a babacona. Tentei escolher algo que me deixasse confortável. Nada naquele lugar era realmente meu, nem mesmo as roupas. Contudo, não ficaria nua na presença daquele homem. Não outra vez.

Penteei os cabelos e os enrolei no topo da cabeça, deixando uma mecha cair sobre o rosto. Saí e fui até onde eles estavam. Nina já estava deitada em seus ombros, e ver isso me deixou nervosa. Não queria me iludir, achando a cena fofa e, novamente, enganar-me com a "mudança" dele.

— Acho melhor colocá-la no berço — não falei muito alto para não a acordar de novo. — Deixe que eu faço isso.

Calmamente, ele se virou e me encarou. Estava sério, como sempre. Parecia chateado, mas isso também era comum.

— Sei como colocar uma criança no berço, Giulia.

Eu diria mais alguma coisa, mas por respeito à paz de espirito da minha filha, calei-me.

Ele foi até lá e a colocou no berço com calma e delicadeza, deixando-me ainda mais estranha por dentro, como na primeira vez em que nos vimos. Eu não era idiota. Sabia que, apesar da mágoa, ainda sentia algo pelo imbecil. Só que a nova Giulia não era mais tão inocente. Apesar da sua disposição em nos ajudar, em parecer bom com crianças, eu não iria baixar a guarda e o deixar entrar nas nossas vidas assim, tão facilmente.

— Ótimo. Muito obrigada pela sua ajuda, mas...

— Temos que conversar — interrompeu-me. — Lá fora. — Puxou-me pelo braço.

Do lado de fora do quarto, puxei meu braço com força para que ele me soltasse. Odiei a sua atitude logo quando achei que poderíamos nos dar minimamente bem.

— Não faça mais isso. — Cruzei os braços, com raiva. — O que quer? Ou melhor, o que resolveu?

— Giulia, sei bem que estou longe de ser a pessoa mais perfeita do mundo — ele começou o seu discurso. Eu sabia bem onde queria chegar. — E não tenho direito algum de pedir que confie em mim ou que me perdoe.

— Coisas que não iriam acontecer de forma alguma — apontei, irônica.

— Ouça-me — pediu mais parecendo mandar. — Tive um encontro com seu pai.

— O quê?! — Merda! Esses dois juntos? — Por quê? O que aconteceu? — Aproximei-me dele, olhando-o nos olhos, claramente ansiosa. — Ele, obviamente, não gostou nada disso.

— Desde quando eu tenho medo dele? — Franziu o cenho.

— Você não, mas eu sim.

— Como eu disse e deixei claro a ele, vocês estão comigo agora, e nada nem ninguém vai machucá-las enquanto estiverem aqui — foi firme.

— Se bem me lembro, não pedi que fosse falar com meu pai e lhe desse uma bronca, e sim que nos tirasse daqui — lembrei-o.

Dante apenas me deixou falando sozinha e desceu as escadas, indo para a sala de estar.

Mais furiosa do que eu naquele momento não existia. Eu o segui, tentando evitar gritar e acordar a minha filha. Se possível, socaria aquele rostinho bonito.

— Temos que falar sobre isso — ele disse, vendo que eu o seguia, furiosa.

— Não temos nada mais para conversar sobre isso — apontei, irada. — Deixei claro o meu desejo ao procurá-lo. O que pensa que está fazendo? Quer mudar o passado e me provar que mudou ou que pode mudar? — Achei isso quase uma piada de mau gosto. — Não vai rolar.

— Olha, querida — falou calmamente, como se fosse ele quem desse o tom da conversa. — Eu mesmo quero que vocês fiquem seguras. E sei bem que ficar comigo é o oposto disso.

— Concordamos. — Novamente, cruzei os braços.

— Mas a Nina é minha filha — justificou. — Apesar do meu erro, meu intuito é a proteger.

— Tendo me deixado com um tirano?

— Cometi um erro — repetiu. — Não sou um santo, não sou perfeito. Amor não é algo que me foi ensinado. Sempre que eu amava, alguém se machucava. E se machuca. — Revirei os olhos ao vê-lo tentando se justificar. — Giulia, eu estou sendo sincero.

— Então vá direto ao ponto.

— Certo. O ponto é que... quero ter o direito de conviver com minha filha.

Ri com ironia.

— Não sabia dela até ontem, e agora está agindo como um pai? — Levantei uma das sobrancelhas.

— Não por escolha, não é?

— Sim. Foi sua escolha me deixar para trás. — Aproximei-me dele, apontando-lhe o dedo. — Você escolheu sua família, e quanto a mim, fiquei no inferno e quase morri. Não pode vir aqui agora com esse papo.

— Pode me odiar, mas eu amo você. — Bateu-me uma vontade de socar o seu rosto, no entanto resolvi me segurar. — Vou pagar, se já não estou pagando, por tudo que fiz com você. Pode não ter volta, mas saiba que farei de tudo para a reconquistar. Além disso, aquela menina é minha filha. Aqui ou em qualquer lugar no mundo podem correr perigo. Não posso voltar no tempo e mudar as coisas, porém posso fazer o máximo possível para tentar consertá-las a partir de agora.

— Não vai rolar.

— Então, vou ter que arriscar. 

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