Capítulo 1 - Um stalker romano
Parte 1...
Isabela
Tem certas situações em minha vida que eu chego a pensar que cuspi na cruz de Jesus. Ou então, eu sou muito maluca.
Só pode ser!
Ao longe eu escuto um som que se repete e aos poucos, vou tomando consciência de que o som está ao meu lado. Forço meus olhos a se abrirem e de imediato pisco várias vezes com a claridade e sinto meus olhos ardendo.
E não é só isso. Minha garganta dói até para engolir a saliva. Tem alguma coisa errada comigo. Sinto todo meu corpo doer e minha cabeça está pesada, como se tivesse uma tonelada pressionando meu cérebro.
Eu puxo o ar fundo e sinto uma dor pulsante e penetrante em meu abdômen. Me sinto confusa. Não entendo essa dor.
Quando minha visão finalmente clareia, a primeira coisa que vejo é uma mão sobre minha barriga. E estou com bandagens.
Por que estou com bandagens? E por que essa mão está me segurando?
Eu conheço essa mão morena, esses dedos compridos. Conheço essas tatuagens. Engulo em seco e minha garganta dói de novo. Meu coração dispara.
Não é possível. Depois de tudo o que passei, não é possível que seja quem eu penso. Movo minha cabeça lentamente para o lado e então confirmo minha suspeita. É ele.
Marco Salvatore. O homem que me enganou e me tratou como uma qualquer.
Realmente, eu cometi algum pecado grave. Nem que seja o pecado da burrice.
** ** **
* Muito antes disso...
Eu já tinha sido avisada sobre os homens romanos, mas viver isso na prática é uma outra história. Eu até me lembro do filme Sob O Sol da Toscana. É bem aquela cena onde a personagem principal precisa comprar uma peça para o lustre e ao passar pelas ruas, os homens andam atrás dela como se fossem urubus.
Bem, não como urubus na verdade, já que a maioria dos homens aqui são um colírio para os olhos de qualquer mulher.
Nossa, eu nunca vi tanto homem bonito, sexy e atraente por metro quadrado como aqui. E não poderia ser diferente. Os romanos são diferentes mesmo. Eles se destacam até dos outros homens do resto da Itália.
Aqui em Roma, até o idioma falado parece não ser o italiano comum. O que acontece é que aqui e nos arredores, é bem comum encontrar pessoas que falam o “romanesco”, que é um dialeto com características distintas.
É muito interessante ficar ouvindo um grupo falar, porque o romanesco tem até regras próprias e um sotaque particular. Eu gosto, acho interessante. Ainda não consigo me comunicar bem nesse dialeto, mas já peguei algumas expressões.
— Sei molto bella per lavorare qui!
(Você é muito bonita para trabalhar aqui!)
Eu finjo que não ouvi e continuo a servir a mesa, onde dois rapazes me encaram como se eu fosse uma peça de carne na vitrine. E olha que o meu uniforme da cafeteria nem é insinuante. Imagine se fosse.
Eu sorrio e coloco a caneca de porcelana na frente de um deles que continua a me encarar. Pergunto se desejam algo mais e claro, a resposta vem de imediato.
— Il mio desiderio è portati via da qui e portati a casa mia.
(O meu desejo é tirar você daqui e a levar para minha casa)
Tão óbvio! Mas eu sorrio e me afasto com um gesto de cabeça. Não vou dar ousadia de responder porque isso fará com que continue falando.
— Garota, hoje parece que os homens vieram com força total.
Angelique é uma amiga francesa que mora comigo no apartamento. Nós dividimos o aluguel com mais uma amiga, Mariane, uma venezuelana.
Nós chamamos o apartamento de território neutro. Cada uma é de um país e não podemos criticar o país da outra, mesmo que discorde de algo sobre a cultura da outra. Mas podemos criticar a Itália e as pessoas daqui.
Eu sei, é uma coisa meio esquisita e até pode parecer preconceituosa, mas não é. Foi o modo que encontramos para nos manter unidas. Nosso apartamento é um território limpo de críticas e preconceitos para nossas culturas, mas estamos livres quando se trata dos outros.
É muito bom morar com elas e divertido também. Especialmente quando esquecemos e falamos nosso próprio idioma e fica uma salada mista. No geral nós falamos o italiano. Com sotaque, mas falamos, é o que importa.
Eu aprendi algumas palavras e frases quando era pequena, com minha avó Natália. Ela era italiana de Nápoles. A mulher mais incrível que eu já conheci na vida e sinto demais sua falta.
Quando ela morreu eu tinha dezessete anos e tive uma crise de choro durante o sepultamento. Ao chegar em casa, tive uma crise de depressão que levou mais de seis meses para passar de verdade.
E quando consegui me livrar da depressão, eu fiquei com a ideia fixa de que viria para a Itália e aqui estou eu hoje.
Não é tão fácil como eu pensei, mas não é tão difícil também. Depende muito do ponto de vista de cada um.
— Eu sei - entreguei um pedido para ela repassar ao pessoal do fundo — Aquela mesa ali os dois até parecem que estão no cio - apontei com o dedo, disfarçando.
Ela olhou na direção e disfarçou, olhando em volta também. Sorriu e se inclinou por cima do balcão.
— Não vira agora para não dar muito na cara, mas tem um homem... - ela mordeu o lábio — Mon Dieu bien-aimé... Que coisa mais deliciosa.
— Onde? - fiquei curiosa.
— Atrás, parte C, do lado da janela - ela me indica a direção.
Eu pego o bloco e a caneta e me viro, dando uma olhada em volta, como se estivesse esperando por um pedido. E então eu o vi.
Realmente, que homem era aquele? Angelique tem razão. Meu Deus amado! Eu até engoli em seco, tentando disfarçar.
Seu rosto angular é expressivo. Notei seu nariz aquilino, a boca grande bem feita, as sobrancelhas densas e quando ele virou o rosto para mim, Jesus, vi seus olhos penetrantes.
Autora Ninha Cardoso.
Obs: livro completo com enredo de máfia.