Dois
Daniela
Eu sou uma alma atormentada, sem qualquer esperança de felicidade, dentro do meu peito só há espaço para a dor, ódio e sentimento de vingança. A minha única satisfação é causar sofrimento, me deleitar com a doce e saborosa sensação que é ver a desgraça daqueles que estão ao meu redor, e me deliciar com o prazer que é ver o desespero de alguém suplicando enquanto você rejeita incansavelmente seus pedidos de socorro. Tais sensações me torna um ser humano cruel e indigno de compaixão, meu espírito já está condenado e não há mais salvação
Eu sou a pior das criaturas!
Um coração congelado!
Um ser sem nenhum sentimento!
Se aproximar de mim é perigoso!
Um anjo que se transformou em demônio!
E tudo por causa daquele baile! Aquele maldito baile!
Tudo por causa daquele dia que eu tento esquecer! Daquela vida que eu deixei para trás! Daquelas terríveis lembranças que eu tento jogar no fundo do poço de sofrimentos que é a minha vida desgraçada. Mas essas lembranças insistem em me atormentar, e elas voltam e voltam trazendo aquele dia como uma tormenta sem fim, como um pesadelo do qual eu jamais irei acordar.
(....)
5 anos atrás
Era uma linda manhã ensolarada, eu ainda era muito ingênua e sorria apenas por ver a beleza que eram as borboletas coloridas passearem por cima das flores que enfeitavam os jardins das casas enquanto eu caminhava nas ruas em direção a escola
Mais um dia de sobrevivência a selva que é o ensino médio, para uns pode ser até uma boa experiência, mas para mim estava sendo terrível, as veteranas, aff, as veteranas cismaram comigo, não sei porque, A Roberta e a Helen me odeiam mesmo eu nunca tendo feito nada para elas, acho que apenas o fato de existir e respirar e caminhar pelos mesmos corredores que elas caminhavam todos os dias já devia o suficiente.
Elas já estavam cursando o último ano, enquanto eu ainda estava no segundo, por sorte minha sala ficava bem longe, então tentava sempre me esconder o máximo possível para escapar do bullying. Eu dava graças a Deus por já estarmos no último bimestre do ano e contava os dias, não, eu contava os minutos, os segundos, para esse ano acabar para que elas saíssem logo da escola e me deixassem em paz.
A única coisa boa que eu achava na escola naquela época era poder ver ele todos os dias, o garoto que fazia meu coração bater mais rápido, Max, o loiro lindo, alto e de olhos azuis, capitão do time de basquete da escola, ele tinha todas as meninas aos seus pés, e é claro nem sabia que eu existia.
Roberta e Helen e as outras garotas líderes de torcida sempre desfilavam com os jogadores e faziam questão de esfregar na cara de todo mundo que eram as donas da escola. Com certeza o inferno que o ensino médio era pra mim, para elas devia ser o paraíso, eu ficava imaginando em como deveria ser bom estar no lugar delas, um lugar que eu com toda certeza jamais chegaria, para mim o melhor momento da escola era a hora de ir embora.
Em casa eu ficava sempre relaxada e me dedicava bastante aos estudos, a prova que eu havia feito para o programa de intercâmbio, ainda demoraria bastante para sair o resultado, mas eu estava bem confiante.
Nélio_ Tenho certeza que você vai ser aprovada Dani! Você não faz outra coisa da vida a não ser estudar
Celson_ Você devia sair mais vezes com seus amigos filha!
"Que amigos?"
Me perguntava mentalmente, pois não queria admitir para a minha família que era um completo fracasso
Daniela_ Eee, pode ser, quem sabe depois
Nelio_ Sabe maminha, eu também não entendo muito de moda mas acho que essas roupas folgadas que você usa também não são muito usadas pelas garotas da sua idade.
Meu irmão sempre fazia questão de dizer essas coisas, talvez por ele ter sido capitão do time na época em que estudava na escola e consequentemente ter ganhado uma bolsa na melhor faculdade do país por causa disso, não aceite muito o fato de eu não ser popular como ele era
Meu irmão Nélio é muito bonito e agora faz faculdade de medicina e mora fora, mas sempre que surge uma oportunidade vem pra Seattle nos visitar.
Na verdade eu tenho amigos sim, o Kauan e o Sérgio, que são mais estranhos e antissociais do que eu, nesse exato momento o Sérgio deve estar em alguma mata procurando insetos para adicionar a sua coleção, e o Kauan deve estar dando banho em algum cachorro no pet shop da sua mãe, o que seria a coisa mais natural do mundo, se por acaso ele não conversasse com os cachorros mais do que conversa com pessoas, resumindo, ficar no meu quarto é o melhor programa do mundo para uma adolescente de dezesseis anos.
Terminando o meu o almoço eu pedi licença e voltei para o meu quarto, lembro que fiquei em dúvida entre maratonar uma série ou continuar minha leitura de "Orgulho e Preconceito", decidi pelo livro e acabei dormindo pensando em um dia encontrar um príncipe encantado como o Mrs Darcy.
No outro dia acordei cedo e começei o meu ritual de preparação para mais um dia de sobrevivência a selva, decidi usar minha camiseta tamanho G do Nirvana e uma calça de moletom, calçei meus tênis e "parti para a selva"
Sérgio_ Vocês tinham que ver a nova espécie que encontrei ontem! Com certeza é uma nova descoberta!
Kauan_ Uma nova descoberta assim como a da semana passada?
Daniela_ Aposto que você está levando dentro dessa caixinha para o professor de biologia verificar
Sérgio_ Vocês podem até caçoar de mim agora, mas um dia eu mostrar para todos as minhas conquistas
Kauan_ Aposto que vai
Kauan e eu começamos a dar risadas, e o Sérgio também, ele sabia que nós éramos os únicos que apoiavam e se divertiam com a sua loucura por insetos, de repente meus livros são jogados com toda força no chão.
Helen_ Olha por onde anda aberração!
A loira passa por mim acompanhada da Roberta e as outras líderes de torcida, vestidas naquelas sainhas e blusinhas do uniforme do time, me encolhi toda e comecei a recolher minhas coisas.
Kauan_ Não liga pra elas Dani!
Daniela_ Poxa! Logo cedo assim!
Sérgio_ Aposto que você vai se esconder o máximo possível hoje!
Daniela_ Com certeza!
Entrei o mais rápido possível e nem me demorei no corredor com os meninos, já fui direto para a minha sala no último lugar, na última fileira e lá permaneci até o sinal tocar, era muito raro eu ir almoçar na cantina como os demais alunos, para evitar que alguém derrubasse o meu almoço ou fizesse coisa pior, e hoje eu não estava nem um pouco afim de participar de algum showzinho onde claramente eu quem me dou mal, então fui almoçar escondida enquanto todos estavam na cantina da escola, eu sempre fugia mesmo para não ser vista, e um dos meus melhores esconderijos, era as escadarias velhas da escola. Enquanto eu estava lá bem tranquila almoçando e revisando o meu trabalho de química, comecei a escutar uns gemidos estranhos vindo de um depósito abandonado, me aproximei devagar e escutei alguns sussurros baixos, era a Roberta.
Roberta_ Ain Max! Que delícia! Você é o melhor!
Max_ O corno do teu namorado não te come direito né safada?
Roberta_ Max você sabe que eu amo o Carlos e nunca vou deixá-lo! Mas...
Max_ Mas?
Roberta_ Você fode como ninguém!
Eu dava passos para trás completamente enojada e ouvindo as altas gargalhadas do loiro quando tropecei em algumas cadeiras velhas e caí.
Rapidamente me levantei e peguei minhas coisas, saí correndo de lá, ouvindo o som da porta se abrindo, se eles me viram eu não sabia, só sabia que meu coração doía por causa de um garoto que eu sabia que nunca seria meu.
Algumas horas se passaram desde o incidente no depósito e como nada de anormal aconteceu comigo, além das provocações e insultos de sempre, eu deduzi que eles não me viram correndo de lá, suspirei aliviada, pois sabia que se a Roberta pelo menos desconfiasse de mim, seria o meu fim.
No momento em que a última aula se encerrou eu me preparei para ir embora, mas antes esperei toda aquela turma barulhenta do basquete e das meninas da torcida passar pelo corredor e ir embora, e lá estava ela, a garota de cabelos ruivos desfilando de mãos dadas com o seu namorado Carlos Udson, e ao lado deles estava o Max conversando com o Carlos e os outros garotos do time muito animado como se nada tivesse acontecido, eu sei que deveria achar o Max um nojento, assim como eu achava a Roberta, mas ele era tão lindo, tão perfeito, aff! Como eu era boba, eu só torcia para o loiro se dar conta e largar aquela ruiva asquerosa.
Passado alguns minutos depois que os populares já tinham ido embora, eu finalmente saí da toca e fui para minha casa, no caminho eu suspirava aliviada Por finalmente ter sobrevivido a mais um dia e poder voltar para casa e entrar no meu quarto aconchegante, eu já imaginava o que iria fazer, tomar um bom banho, escolher e maratonar alguma série bem boba e romântica, as provas finais já estavam acabando, mas eu já sabia todo os conteúdos e a uns três meses atrás eu já estava aprovada então eu realmente estava tranquila em relação a isso.
Eu caminhava distraída perto do parque quando escutei a voz grossa de alguém chamar o meu nome, eu congelei na mesma hora, pois jamais imaginei que algum dia ele pronunciaria o meu nome
Max_ Oi! É Daniela não é?